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Teatro

Peça de João Paulo 2º é montada em SP

"A Loja do Ourives", escrita pelo papa polonês aos 40 anos, ganha versão musical moderna com estreia em maio

Série de monólogos sobre casamentos é adaptada para texto mais ágil; produção custou R$ 2,5 milhões

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER
DE SÃO PAULO

A atmosfera lembra "American Idol". Perante uma banca linha-dura, os candidatos interpretam Abba ("Mamma Mia") e o musical "Cabaret".

É dia de teste no Tuca, o teatro da PUC de São Paulo. Uma atriz ajeita a calça justinha e dá um tapa no decote. Outra chuta a nacionalidade do autor: "Italiano, né?".

Todos concorrem a um papel na "peça do papa".

Karol Wojtyla (1920-2005), o papa polonês João Paulo 2º, terá uma obra sua adaptada para o palco brasileiro. O musical "Enlace - A Loja do Ourives" estreia em maio, no Tuca, com temporada de três meses orçada em R$ 2,5 milhões (o plano, depois, é rodar pelo país e pela Europa).

À beira da Segunda Guerra, o rapagão de porte atlético tentou atuar na Polônia. Lá pelos 40 anos, já como bispo, Wojtyla publicou "A Loja do Ourives" -série de monólogos sobre casamentos que vão bem. Ou bem mal.

"Achei ousado registrar que o matrimônio pode não dar certo. Ele, ícone de uma instituição que prega o casamento eterno", diz Elísio Lopes Jr., autor dessa rara adaptação a obter chancela do Vaticano.

Assinada com o pseudônimo Andrzej Jawién, a peça original aborda divergências na vida a dois, tema espinhoso para a Igreja Católica.

São três casais em épocas variadas. Um está prestes a se casar. O outro passa por crise -a mulher até tenta se desfazer da aliança e se oferecer para outros homens. A terceira dupla é formada por filhos dos casais anteriores.

Na segunda-feira, a Folha acompanhou a audição para papéis secundários -cerca de 1.400 atores inscritos para 13 personagens. O elenco principal conta com Françoise Forton, Luiz Guilherme, Claudio Lins e Gisele Tigre.

LIVREMENTE INSPIRADA

Na adaptação, os atos ganham coadjuvantes e tramas paralelas. Tudo se desenrola na Polônia, sob o ponto de vista de avó, mãe e filha, entre 1939 (Segunda Guerra), 1968 (era do amor livre) e 1989 (comunismo em ruínas após queda do Muro de Berlim).

Não que a moral das histórias deixe de reforçar a virtude do matrimônio. Mas a nova montagem traz cenas inimagináveis num texto papal.

Um exemplo: o núcleo de 68 tem a feminista Ewa, uma atriz que "topa ficar pelada", não quer se casar com o namorado e condena a "cabecinha enferrujada" dos velhos.

Para o diretor, Roberto Lage, a versão brasileira deu agilidade à peça. Como dramaturgo, Wojtyla "era muito ruim", com falas longas demais: "A antidramaturgia".

Apesar de ser escrita por um papa, a narrativa original não é dogmática, defende Lage. O homem "que discorda frontalmente do Vaticano" diz ter topado o desafio ao enxergar ali elementos universais, como "cumplicidade" e generosidade". E isso "atravessa todas as religiões".

"Alguma coisa está acontecendo lá em cima, porque sou ateu, e o Karol me deixou montar essa peça", brinca o diretor.

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