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Arte perdeu a dianteira, diz ex-produtor de Bob Dylan

Jonathan Taplin, que trabalhou com Scorsese, lamenta abandono do discurso político

Professor de mídias digitais esteve em feira televisiva no Rio e mostrou ser entusiasta das novas mídias

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

Jonathan Taplin, 64, tira o iPad da mochila. "Acho que as coisas mais revigorantes estão sendo feitas aqui."

O produtor norte-americano, que veio ao país participar da feira televisiva RioContentMarket, abre um e-book com escritos seus sobre rock. Toca a tela do tablet e, em vez de desfilarem retratos paradões, como num livro à moda antiga, surge um vídeo de Bob Dylan no YouTube.

A essa altura, os olhos de Taplin brilham. No passado, produziu shows de Dylan, virou amigo de Martin Scorsese e organizou, a pedido de George Harrison, um concerto histórico pelo Bangladesh, com Ringo Starr e Eric Clapton. Seu currículo inclui ainda filmes e atrações de TV indicados ao Oscar, ao Emmy e exibidos em Cannes.

A atenção de Taplin está agora voltada ao futuro do audiovisual. Professor de mídias digitais da USC (Universidade do Sul da Califórnia) e entusiasta das novas plataformas, ele recebe vários alunos "que não têm ideia do que foi o movimento dos direitos civis". Para suprir o lapso histórico, ele saca vídeos de "jovens da idade deles lutando contra a polícia e seus cachorros" mas também clipes de Dylan cantando "The Times They're A-Changin'".

Para Taplin, há uma revolução em marcha quando passa a ser possível "ver o vídeo e, 'click!', entrar num link que nos leve a outro lugar".

Imagine "...E o Vento Levou" (1939). A Folha pergunta como o épico funcionaria hoje. "Talvez você pudesse escolher entre o ponto de vista da babá negra e o de Scarlett O'Hara. Poderia escolher."

OUTROS TEMPOS

Era 1965, um belo ano para se ter 18 anos. Estudante de Princeton, Taplin conheceu o empresário de Bob Dylan num festival. Logo virou "da turma". Os anos seguintes, bem, esses viraram história -uma história em que se liquidificavam música, invenções de Andy Warhol, o movimento dos direitos civis.

A cultura "estava, então, na linha de frente da revolução", diz o produtor, para quem aquele sonho morreu.

"Nos EUA, as pessoas ficaram acomodadas, gordas e petulantes. Acontece quando você tem 500 canais de entretenimento à disposição", diz.

Nem medalhões se salvam. "Infelizmente, eles se adaptaram. Agora, Bob [Dylan] sai por aí cantando suas velhas músicas. Faz isso muito bem, mas não é a mesma coisa."

A nova geração, para Taplin, também deixa a desejar. "Gosto muito de Bono, mas acho que ele gosta de estar perto demais dos poderosos. Prefere Davos [na Suíça, sede do Fórum Econômico Mundial] a 'Santo Alegre' [Porto Alegre, que abriga o Fórum Social Mundial]."

"Ocasionalmente, alguém do hip-hop, como Jay-Z, faz algo político", ressalva. Dizer isso não é injusto com artistas como M.I.A., a cantora anglo-cingalesa de clipes recheados de metáforas políticas? Bom, Taplin não acha que o trabalho dela tenha peso.

Para dar a dimensão de seu desconsolo, recorre ao futuro imaginado por dois gigantes da ficção científica: George Orwell (1903-1950) e Aldous Huxley (1894-1963). "Orwell achou que o mundo seria uma ditadura. Huxley pensou o oposto: que o Estado não precisaria fazer nada. Todos estariam tão alienados que não dariam problema."

Taplin acredita que estamos a meio caminho do mundo de Huxley: "Isso é triste".

A jornalista ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER viajou a convite do RioContentMarket

Leia a íntegra da entrevista
folha.com/no1058982

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