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Cinema

"Fazer filmes é só trabalho", diz diretor

Artista plástico reconhecido, britânico Steve McQueen diz que seu objetivo como cineasta é desafiar as pessoas

Ele volta às telas com "Shame", que estreia hoje no Brasil, após sucesso de crítica com "Hunger" (2008)

JASON SOLOMONS
DO “GUARDIAN”

Leia a seguir entrevista com Steve McQueen, diretor de "Shame".

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Depois de "Hunger", de 2008, você criou o doloroso "Shame". Fazer cinema é algo que você ainda acha instigante?

Steve McQueen Pude ver o que há por trás da cortina. Admito que fiquei excitado quando "Hunger" foi lançado em Cannes e fez sucesso. Eu fui para Hollywood pela primeira vez e fiquei emocionado ao ver o letreiro grande: HOLLYWOOD. Mas, depois de alguns jantares e festas, você percebe que o importante mesmo é arregaçar as mangas. Fui ao set da Paramount, vi gladiadores e elefantes andando a meu lado. Mas aí você vê os andaimes e os caminhões e percebe que é tudo trabalho, apenas isso.

O cinema, então, não é mais o lugar de criação de mitos?

Bem, não é para isso que eu faço filmes. Eu teria gostado de ainda ser apenas alguém que vai ao cinema nos fins de semana. Fazer cinema é muito decepcionante. É como descobrir que Papai Noel não existe.

Essa percepção que você ganhou limita seu trabalho?

Não sei. É tudo falso, não? Conheci pessoas que admirava e descobri que eram gente normal, e não deuses.

O mundo das artes plásticas deve ser a mesma coisa, não?

Não, o cinema é muito diferente. É importante, até mais que uma reportagem ou um romance. Cria imagens que as pessoas nunca viram ou imaginaram que veriam, possivelmente porque precisavam de outra pessoa que as imaginasse por elas.

Hollywood cortejava você?

Eu não saberia fazer filmes americanos. Eles gostam de finais felizes. Fiz "Shame" nos EUA, mas não é um filme de Hollywood. Meu negócio é desafiar as pessoas. O público forma uma opinião sobre as pessoas na tela, assim como faz na vida real. É o que me fascina no cinema. Quando veem um personagem na tela, elas se perguntam se ele é como elas supunham ao vê-lo pela primeira vez.

Isso é porque você não é o que as pessoas esperam? Especialmente por se chamar Steve McQueen [como o ator americano (1930-1980)]?

Talvez (risos). Uma coisa é certa: não sou quem as pessoas pensam que sou. Sempre faço o que quero fazer, meus filmes são pessoais. "Hunger" foi sobre minha juventude, a perda da inocência quando me dei conta do que meu país estava fazendo, do que estava acontecendo.

Brandon, em "Shame", é minha resposta a ter ficado perdido. Não vivi aquilo exatamente, a adição sexual, mas já estive perdido.

Por que decidiu filmar "Shame" em Nova York?

Em Nova York, todo mundo vem de outro lugar, tudo gira em torno dos imigrantes. É uma cidade que sempre pode se reinventar. E isso é o que queria para meu personagem: um lugar onde se esconder.

Por que fazer um filme sobre um viciado em sexo?

Quando você tem tudo, por que pode querer jogar tudo para o alto? É essa a questão. Poderiam ser drogas ou álcool, mas aqui é sexo, e escolhi o sexo porque as pessoas não falam sobre isso. O sexo tem um estigma que as drogas e o álcool não carregam mais.

A arte oferece respostas a questões políticas e sociais?

A arte não pode solucionar nada, só observar e retratar. O que é importante é que vira um objeto, uma coisa que você pode ver, sobre a qual pode falar e à qual pode se referir. Um filme, mais do que um incidente propriamente dito, é um objeto em torno do qual você pode ter uma discussão. É a visão de alguém sobre um incidente -um ponto de partida avançado.

Tradução de CLARA ALLAIN.

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