Índice geral Ilustrada
Ilustrada
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Mônica Bergamo

monica.bergamo@grupofolha.com.br

Caminho de só Thiago

Dois meses após deixar o Exaltasamba, Thiaguinho sai em carreira solo e quer provar que existe 'pagodeiro do bem, que estudou e tem família'

Fotos Adriano Vizoni/Folhapress
O cantor Thiaguinho no Credicard Hall, em São Paulo
O cantor Thiaguinho no Credicard Hall, em São Paulo

Thiago André Barbosa, 29, o Thiaguinho, tinha 12 anos quando deixou sua cidade natal, Presidente Prudente (SP), e desembarcou na capital paulista para participar de peneiras (seleção) de futebol em dois clubes, São Paulo e Juventus. Ao chegar nos testes, o corintiano se deparou com garotos que tinham o dobro de seu tamanho e travou. Acabava ali o sonho do garoto, fã de Viola, Neto e Marcelinho Carioca, de virar jogador de futebol.

"Aí, o pagode me ganhou", diz o cantor. A música não o impediu de continuar jogando suas peladas, mas hoje lhe permite ter como colegas em campos improvisados os amigos Neymar, Robinho, Ganso, Elano e André Santos, que são seus fãs e frequentam seus shows.

Na quinta-feira, ele gravou em São Paulo o DVD "Ousadia & Alegria", que dá início à sua carreira solo após nove anos no grupo Exaltasamba. Conseguiu levar ao palco Gilberto Gil e Ivete Sangalo. Até o fim de maio, já tem agendadas 15 apresentações.

Em janeiro, Thiaguinho, compositor da maioria de suas músicas e coautor do hit "Fugidinha" ("O jeito é dar uma fugidinha com você"), sucesso na voz de Michel Teló, ocupou o 3º lugar no ranking de arrecadação do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), atrás dos sertanejos Victor Chaves (1º) e Sorocaba (2º). E à frente de Roberto Carlos (4º) e Caetano Veloso (10º).

A arrecadação de direitos autorais, diz, "poderia ser melhor. Não dá pra viver só de composição. Ganhei dinheiro, mas para um compositor viver assim não dá", afirma à repórter Lígia Mesquita. "Não esperava chegar a essa proporção de todo mundo me pedir música, de ter essa representatividade. Comecei a compor pela necessidade de suprir o que queria cantar."

O rótulo de pagodeiro, afirma, não o incomoda. "Eu faço pagode, sem medo." Diz que não teme ser alvo de preconceito. "Isso vem quando você faz coisa errada. Nunca fiz nada de errado. Quero mostrar para as pessoas que existe pagodeiro do bem, que já estudou, tem família, que não tem um monte de pensão [alimentícia] pra pagar. Eu não tenho nenhuma pensão pra pagar! [risos]!"

O preconceito com o gênero musical que abraçou "é atrelado ao racial que é atrelado ao social. Tudo disfarçado", afirma. "Geralmente, quem não gosta de pagode não gosta de funk, não gosta de rap. Tudo música de preto." Conta que já ouviu inúmeras vezes as pessoas falarem: "Você veio da favela, né?". "E eu: Não. Meus pais são professores, tive sempre uma vida normal, estudei, comecei a fazer faculdade. As pessoas acham que quem toca pagode é da favela, não estudou", diz.

A fama não o impede até hoje de sofrer manifestações racistas. "Outro dia fui almoçar num restaurante de shorts, camiseta e chinelo. Quando o manobrista trouxe o meu carro e eu fui entrar, ele colocou a mão na frente. Não achou que aquele carro pudesse ser o meu e perguntou: 'Você é o dono?'", lembra. "Tem um preconceito velado quando alguém vê um negro com um carrão. Logo perguntam: 'É jogador ou pagodeiro?'. Ou seja, no Brasil o negro só pode ter dinheiro se tiver uma dessas duas profissões. E vivem me perguntando se sou jogador."

Thiaguinho começou a cantar aos 11 anos, no coral da igreja católica frequentada pelos pais. Como gostava de escrever e declamar poesias, começou então a fazer aulas de violão. "Durou três meses." Aos 14, ganhou um cavaquinho. "E desde aquele dia comecei o sonho de querer ser pagodeiro."

O cantor chega ao Credicard Hall, em SP, na quarta-feira, às 19h30, para o ensaio de véspera de seus shows. Está acompanhado do pai, João Barbosa, do segurança, "Thiagão" Ferreira, e do produtor Adriano Oliveira, que trabalha com ele há sete anos. "Nunca ouvi o Thiago pedir uma coisa sem falar 'por favor' e 'obrigado'", diz Oliveira. O cantor entra no camarim e vê várias garrafinhas de água em cima da mesa. "Vamos tirar os rótulos porque eles não estão pagando nada pra gente", brinca.

De calça com a barra dobrada e camisa jeans bem clarinha, hesita falar o nome das grifes que veste. "Vou fazer essa propaganda?". Conta que está de Armani, Osklen e mocassins Sérgio K.

Aos 15 anos, montou seu primeiro grupo, o Roda de Samba. Dois anos depois, já em carreira solo, se apresentava em bares de Presidente Prudente (SP). Melhor aluno da classe, segundo o pai, fez vestibular para música em universidades públicas. "Não passei e fiquei frustrado. Aí fui fazer Comunicação." No primeiro ano do curso, uma pessoa que o contratava o incentivou a se inscrever para a seleção do reality show "Fama Bis" (Globo). Foi aceito. Não ganhou a atração, mas seis meses depois entrava no Exaltasamba.

Com o dinheiro que ganhou, realizou o sonho da casa própria. No caso, duas. Uma na cidade natal e um apartamento na zona sul de SP, onde mora com os pais e uma irmã. "Meu pai sempre me disse: 'Um homem sem casa não tem nada'." Gosta de gastar com roupas e CDs. E não tem nenhum sonho extravagante de consumo. "Só quero conforto pra minha família. Não me preocupo com dinheiro, tenho esse defeito."

A amizade com os boleiros, conta, começou nos shows do agora extinto Exaltasamba. A parceria com os craques rendeu sua participação em grandes campanhas publicitárias. Ao lado de Neymar, estrela a de um refrigerante. Os dois aparecem dançando na praia. E também participa da propaganda da marca esportiva patrocinadora da seleção brasileira.

Comentários de que ele poderia estar se aproveitando da amizade com Neymar para lucrar não o incomodam. "Nós dois somos muito bem sucedidos no que fazemos. A gente não precisa disso. O que importa é que um conhece bem o outro."

Com o amigo estrela diz que não dá pra sair. Normalmente um vai à casa do outro. E conta que um dia foi a Santos jogar bola com o craque. Quando chegou, avistou uma multidão e não entendeu. "Descobrimos que na véspera o Ney tinha ido lá pra reservar a quadra e os caras escreveram na lousa: '19h -Neymar'. No final da pelada tinha umas 300 pessoas."

Caseiro, diz que nas férias gostava de não fazer nada além de ficar com a namorada, a atriz Fernanda Souza, assistir a filmes e ir à missa. "Cresci dentro da igreja. Tudo que eu tenho pedi demais pra Deus, pedi de verdade e ele me deu. Sou muito grato."

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.