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Crítica teatro Clamor ideológico fragiliza boa montagem de Frateschi LUIZ FERNANDO RAMOSCRÍTICO DA FOLHA Um drama possível. "Estação Paraíso/12", texto e encenação de Celso Frateschi, é uma tentativa honesta, mas discutível, de apresentar a vida contemporânea por meio da forma dramática. O autor parte de um personagem típico: gerente de recursos humanos que, demitido, decai ao ponto de tornar-se cativo de uma igreja evangélica. Ele está escondido em um buraco de metrô, prestes a meter uma bala na cabeça, quando é surpreendido pela própria sombra. Inicia-se aí a ação da peça. Perceber o segundo personagem em cena como a sombra do primeiro é uma de várias leituras possíveis. Outra seria vê-lo como um anjo da morte. De qualquer modo, essa presença garante um fluxo de diálogos que permite o desenvolvimento de alguns temas. Um deles é o do preconceito racial e de classe, que aparece na reação do ex-executivo, branco e de terno e gravata, à presença desse espírito, encarnado por um negro vestido como um Exu. O discurso que o primeiro vomita é uma coleção exemplar de impropérios racistas. Outro tema persistente é o da fé religiosa, que aparece tanto nas evocações salvacionistas do branco como no discurso ateísta do preto, defensor de sua própria tese sobre o "deus do dinheiro". Aqui a montagem se fragiliza, já que a preocupação do dramaturgo em desvendar o sistema econômico alienante que nos condiciona se sobrepõe à do personagem, agora porta-voz de uma análise estranha ao seu caráter demoníaco. Um desfecho previsível confirma esse sequestro da trama em favor de conclusões morais externas a ela, que pacificam o personagem desencantado e o encaminham rumo à redenção. Os atores Fernando Nitsch e Tayrone Porto cumprem com brilho a demanda da direção do espetáculo, de serem agentes verossímeis cujas falas permitem o debate de ideias proposto. O cenário de Sylvia Moreira, inspirado e simples, com dois trilhos de luz e uma tela de arame na boca de cena, também colabora. O espetáculo, afinal, realiza aquilo a que se propõe: evocar os impasses do ser humano na contemporaneidade, a despeito do clamor ideológico que o inflama.
ESTAÇÃO PARAÍSO/12 |
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