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Crítica / Romance Livros tentam salvar vampiros da morte por pieguice e diabetes DE SANTIS CRIOU UMA TRAMA COM AÇÃO E MISTÉRIO INCESSANTES, ATRIBUINDO PERSONALIDADE HUMANA AOS VAMPIROS JOCA REINERS TERRONESPECIAL PARA A FOLHA Algoz desde o surgimento na versão romanesca criada por John Polidori em 1819, a figura literária do vampiro nunca foi tão desmoralizada como nos últimos tempos: de mortos-vivos sanguinários dos livros de Bram Stoker e Anne Rice a meros ruminantes de alface na série "Crepúsculo", de Stephenie Meyer. Recém-publicados, dois livros procuram salvar o monstro da morte por pieguice e diabetes: o clássico moderno "Senhorita Christina", de Mircea Eliade (1907-1986), e "Os Antiquários", do argentino Pablo de Santis. É pouco notório, mas o romeno Eliade, célebre por sua trajetória como historiador das religiões, também cometeu lá suas ficções. Publicada em 1936, a novela "Senhorita Christina" é construída a partir da erudição de seu autor, e surgem daí seus maiores problemas. Com entrecho clássico aprendido com o romance gótico (cuja regra essencial é: ponha uma mulher neurótica em um casarão assombrado e veja o que acontece), o livro narra a estada de Ígor, jovem pintor, e do arqueólogo Nazarie na casa de dona Moscu, também habitada pelas filhas Sanda, 20, e Simina, garota de nove anos que faria Lolita corar. A paisagem bucólica às margens do Danúbio é nublada pela influência fantasmática da irmã morta da anfitriã, Christina, uma morta-viva que se alimenta de dona Moscu e de Sanda e seduz o galante Ígor (desejado inclusive pela precoce Simina), interessada noutra parcela de seus fluidos corporais que não exatamente o sangue. De erotismo meio cafona e linguagem vencida pelo tempo, a ficção empaca no didatismo empolado de Eliade. Investida mais satisfatória é a de Pablo de Santis. O argentino nascido em 1963, hábil praticante do relato policial, criou uma trama com ação e mistério incessantes, atribuindo personalidade humana, demasiado humana, aos vampiros urbanos de "Os Antiquários". Desenrolada na Buenos Aires dos anos 50, relata a chegada do jovem Santiago Lebrón à Redação de um jornal, onde acaba responsável pela coluna de esoterismo. Cooptado pelo enigmático Ministério do Oculto, é levado a investigar uma seita secreta que persegue colecionadores de antiguidades. Lebrón termina se apaixonando e depois trabalhando para um dos antiquários, Carlos Calisser, responsável por transformá-lo em vampiro. Introduzido aos segredos da vida eterna, a ficha cai para Lebrón quando ele se vê proibido de amar. Fábula acerca da intransponibilidade de certas fronteiras, "Os Antiquários" é livro de pegar e não largar. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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