Crítica / Comédia

La Mínima faz raízes do teatro clássico aparecerem cristalinas e insuperáveis

"Mistero Buffo", espetáculo da Cia. La Mínima, consagra seus criadores e confirma como um desempenho vigoroso de atores pode atualizar as formas mais simples e insubstituíveis do teatro.

A encenação reúne alguns dos monólogos criados pelo múltiplo artista italiano Dario Fo, em 1969, a partir de sua pesquisa dos jograis (ou histriões medievais).

Os comediantes populares adaptavam os Mistérios -histórias bíblicas encenadas pela Igreja- para versões satíricas e profanas, com críticas ácidas à instituição religiosa.

A diretora Neyde Veneziano selecionou e traduziu quatro desses episódios, buscando sintonizá-los à fala corrente no Brasil, e adaptou, com os integrantes da La Mínima, sua estrutura original às praticas da companhia, centradas na dinâmica dos palhaços de circo.

As narrativas escritas por Fo ganham em teatralidade e encantam, atualizadas pelo jogo elementar e rico dos extraordinários comediantes Domingos Montagner e Fernando Sampaio, auxiliados pelo não menos marcante Fernando Paz.

Os três artistas arrebatam desde a primeira aparição, ainda na plateia, vestidos com o belo figurino concebido por Inês Sacay.

Mas é quando sobem ao palco -organizado pela cenografia de Montagner, com arquibancadas laterais- e ocupam o centro, despojados de qualquer adereço, que revelam a força de seu talento.

É emocionante ver as reconstituições da ressurreição de Lázaro ou da Paixão de Cristo, montadas com as palhaçadas de Sampaio e Montagner, e as hilárias pontuações musicais de Paz. As raízes do teatro popular, fundadas no histrionismo mais singelo e no ritmo preciso de corpos ágeis, reaparecem cristalinas e insuperáveis.

Na comemoração dos seus 15 anos, a La Mínima não só resgata um clássico do laureado Dario Fo como concretiza uma homenagem pungente ao circo brasileiro, fonte primária de sua trajetória.