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Crítica Conto

Mascaramento e duplicidade são os temas essenciais do francês Jean Lorrain

Lorrain é um tremendo escritor -no varejo. Apesar dos rebuscamentos, sua escrita é fascinante: equilibra-se com maestria entre o realismo e o fantástico

ALCINO LEITE NETO
ARTICULISTA DA FOLHA

Eis um episódio da belle époque. Em 6 de fevereiro de 1897, na floresta de Meudon, a cerca de 12 km de Paris, defrontaram-se para um duelo Marcel Proust e Jean Lorrain.

Proust tinha 25 anos e lançara há pouco o seu primeiro livro, "Os Prazeres e os Dias".

Lorrain, 41, era um dos mais corrosivos cronistas da imprensa parisiense e polêmico escritor decadentista, obcecado por temas perversos e mórbidos.

Sua fama como escritor e jornalista, suas excentricidades de dândi e viciado em éter, bem como suas indiscrições como homossexual, corriam a Europa -e chegariam até o Brasil, influenciando João do Rio.

Três dias antes do duelo, Lorrain publicara uma crítica a "Os Prazeres e os Dias", na qual aludia, maldosamente, às relações de Proust com Lucien Daudet, o filho de 18 anos do celebrado escritor

Alphonse Daudet.

O duelo desses dois mundanos -o delicado Proust e Lorrain, o "viking afeminado" (nas palavras de Ghislain de Diesbach)- acabou sem uma gota de sangue.

Lorrain morreu em 1906; Proust, em 1922. A glória literária do autor de "Em Busca do Tempo Perdido" foi se avolumando ao longo do século 20. A de Lorrain foi se desvanecendo: passou a ser lembrado principalmente por seu posto exótico no folclore do "fin-de-siècle" parisiense.

BOM NO VAREJO

Merece, portanto, saudação esta iniciativa da editora Antiqua de desenterrar a literatura de Lorrain do esquecimento com "A Vingança do Mascarado", volume de 14 contos e oito anexos de interesse biográfico e crítico.

Lorrain é um tremendo escritor -no varejo. Apesar dos rebuscamentos, sua escrita é fascinante: equilibra-se com maestria entre o realismo e o fantástico, conduzida por um misto de ironia, erotismo, mistério e devaneio.

No atacado, porém, os contos deixam a desejar. Os temas se repetem, as obsessões vão e voltam, numa fatigante busca pelo estranho, o aberrante e o perverso.

O talento que possui para a observação social e psicológica é frequentemente sacrificado em prol do escândalo e da sensação.

Os temas essenciais das histórias são o mascaramento, a duplicidade, o segredo (e este último não seria também um dos motes de Proust?).

Todo indivíduo, todo núcleo social, guarda um segredo, e Lorrain -afinal, um "moraliste"- se investe da tarefa de revelar o que oculta a máscara de cada um e desbaratar hipocrisias.

O que nem sempre vale a pena, pois, para ele, as máscaras também podem guardar perversas utilidades: desafiam as convenções, embaralham as identidades (inclusive sexuais) e acentuam o que há de fantasmático na vida social.

A VINGANÇA DO MASCARADO

AUTOR Jean Lorrain

EDITORA Antiqua

TRADUÇÃO Marcos Salgado

QUANTO R$ 28 (168 págs.)

AVALIAÇÃO bom

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