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Carlos Heitor Cony

Memórias de um sobrevivente

Nelson Rodrigues dizia que "na 'Manchete', até o anúncio de maionese é uma obra de arte"

Com este título, a Nova Fronteira está lançando um novo livro de Arnaldo Niskier, com o subtítulo

"A Verdadeira História da Ascensão e Queda da Manchete". É o terceiro livro que, em menos de quatro anos, evoca um dos homens mais complexos do seu tempo: Adolpho Bloch.

Em 2008, tivemos "Os Irmãos Karamabloch", de Arnaldo Bloch; em 2010, "Seu Adolpho", do professor Felipe Pena. O primeiro apresenta a história da família Bloch, gráficos na Ucrânia, que imprimiram o dinheiro do regime de Kerenski e emigraram para o Brasil em 1922. Foi escrito por um membro da família e logo tornou-se best-seller. O segundo levanta parte do pitoresco folclore criado por Adolpho.

O livro de Niskier trata de forma impecável o Brasil e o mundo em que o personagem viveu e trabalhou, criando uma revista que, de 1952 a 2000, foi um marco da imprensa brasileira em vários sentidos, tanto na vida cultural do país como na excelente produção gráfica que fez Nelson Rodrigues, um dos cronistas da revista, dizer que "na 'Manchete', até o anúncio de maionese é uma obra de arte".

Personagem polêmico, admirado por uns e criticado por outros, Adolpho aparece no livro de Niskier como de fato foi, um empresário audacioso, nascido em 1908, que amava o Brasil acima de tudo, tendo também amado o país natal na mesma medida em que odiava a União Soviética, onde sua família sofreu dolorosos pogroms.

Enquanto no livro do sobrinho (Arnaldo Bloch) aparece a saga de uma família de emigrantes que aqui chegou em 1922, o livro de Arnaldo Niskier trata basicamente da figura pública de Adolpho, e não haveria melhor historiador do que o autor, que teve parte de sua intensa vida de escritor, jornalista e educador ligada ao "titio" -tratamento que por diversos motivos se justifica.

A relação entre os dois foi mais do que afetiva, tanto na vida profissional como na particular. Adolpho tinha um baita orgulho do sucesso daquele jovem que exerceu várias funções de diretor em suas empresas, ao mesmo tempo em que conquistava espaço na carreira de educador, sendo na sua época o mais jovem catedrático (por concurso) do Brasil.

Mestre em organizar seu tempo, Niskier nunca descuidou de sua vida acadêmica, é autor de livros didáticos, históricos e de ficção. Por três vezes foi secretário de Estado, sendo o primeiro titular da pasta de Ciência e Tecnologia do país, no governo de Negrão de Lima, secretário de Educação no governo de Chagas Freitas e secretário de Cultura na gestão de Rosinha Garotinho. Foi também o primeiro brasileiro judeu a ocupar a presidência da Academia Brasileira de Letras.

Adolpho formou uma equipe de colaboradores que ele tratava como filhos: seu sobrinho Jaquito, que o sucedeu na direção de suas empresas, Murilo Melo Filho, Zevi Ghivelder, Salomão Schvartzman, Leonardo Bloch e Isaac Hazan.

E reuniu em suas revistas, mais tarde em sua televisão, uma turma da qual faziam parte Clarice Lispector, Carlos Drummond de Andrade, Sérgio Porto, Otto Maria Carpeaux, Rubem Braga, Paulo Mendes Campos, Ronaldo Bôscoli, Carlos Lacerda, que, além de entrevistas, ali publicou suas memórias ("Rosas e Pedras do Meu Caminho"), David Nasser, Pedro Bloch, Otto Lara Resende, João Saldanha, Ibrahim Sued,

R. Magalhães Jr., Joel Silveira, Fernando Sabino, Ruy Castro, Roberto Muggiati, Ricardo Noblat, Cícero Sandroni, Nelson Pereira dos Santos, Ledo Ivo, Fernando Barbosa Lima, Vinicius de Moraes, Maurício Sherman, Afonso Arinos Filho, José Wilker e muitos outros.

Lançou Xuxa e Angélica no showbiz, produziu a novela "Pantanal", um dos maiores sucessos da televisão brasileira.

Niskier mostra panoramicamente uma das fases mais brilhantes da vida nacional, tanto no cinema, no esporte e no teatro como na música popular e no Carnaval. O editor Alfredo Machado, fundador da Record, dizia que o melhor Carnaval do mundo não era o do Rio, era o da "Manchete". A dedicação de Adolpho a JK, nos tempos da ditadura, provocou dramática tentativa de sua expulsão do país. Ele abrigou ostensivamente cassados e perseguidos, como Mário Martins, Ivan Alves, Heloneida Studart, Elias Fajardo e dezenas de outros.

O novo livro que Arnaldo Niskier está lançando será referência obrigatória aos estudantes e pesquisadores de um largo tempo da vida brasileira.

AMANHÃ NA ILUSTRADA:
Álvaro Pereira Júnior

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