São Paulo, domingo, 01 de maio de 2011

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DIÁRIO DE NOVA YORK
O MAPA DA CULTURA

Máxima arte

Vem chegando o verão

VINCENT KATZ

MAIO É O ÚLTIMO MÊS da temporada cultural de Nova York, antes do início das férias do verão americano. Na primavera deste ano, o minimalismo -que está sempre na moda, como o pretinho básico no guarda-roupa feminino- voltou, de forma espetacular na mostra de desenhos de Richard Serra no Metropolitan Museum, e com uma presença mais sutil em outros lugares. Os temas geométricos das imagens minimalistas, associados a um distanciamento das técnicas tradicionais, deram o foco de várias exposições recentes.
Uma sensibilidade silenciosa está presente na mostra de trabalhos de Eva Hesse e Sol LeWitt na galeria Craig F. Starr, em cartaz até 27 de maio. Trabalhos realizados entre as décadas de 1960 e 2000 mapeiam a amizade entre esses dois artistas (Hesse morreu em 1970, aos 34 anos, e LeWitt, em 2007, aos 78), que fizeram seus próprios experimentos com formas e materiais.
Enquanto LeWitt é conhecido principalmente por suas esculturas modulares e desenhos de parede conceituais, em que a obra de arte se transforma em um conjunto normativo, Hesse é vista como uma artista inovadora por utilizar materiais industriais em formatos que sugerem florestas em decomposição e outros objetos com configurações semelhantes.
Mesmo uma escultura cúbica pequena ("Accession V", de 1968) assume um tom sinistro nas mãos de Hesse, quando notamos os pontos de borracha que se repetem, voltados para dentro, a partir do quadro de aço do cubo.

ESTRIPULIAS DE WARHOL
"Unpainted Paintings" adota uma visão interessante diante da visão -hoje desacreditada- de que a pintura estaria morta. A exposição, que fica na galeria Luxembourg & Dayan até 27 de maio, exibe obras que têm aparência de pinturas e rejeitam o uso da tinta como técnica.
Com curadoria de Alison Gingeras, a mostra começa com uma tela de Robert Rauschenberg, de 1955, feita de jornal e folhas de ouro laminado -uma imagem enigmática, brilhante, destituída de expressão.
Nos "Piss Paintings" de Andy Warhol, produzidos nos anos 1970, a urina é utilizada para criar estranhos padrões inexpressivos e opacos em telas recobertas de gesso.
"Nil" (1981), de Julian Schnabel, é o oposto do minimalismo. Revela-se muito "materialista" em sua opção de superfície: um tapete peludo encoberto por óleo e pasta de modelar. Embora Schnabel venha se dedicando cada vez mais à carreira de pintor, é mais conhecido como cineasta.
É responsável por filmes aclamados sobre o pintor Jean-Michel Basquiat, o escritor cubano Reinaldo Arenas e o editor de moda francês Jean-Dominique Bauby. Em todas essas histórias, o tema da criatividade, que se manifesta superando obstáculos enormes, é transmitido por meio da fotografia suntuosa e de imagens memoráveis.
Como vários pintores de sua geração, Schnabel encontrou no cinema uma forma alternativa de arte que condiz com seu temperamento e sua visão grandiosa.

A PALESTINA DE SCHNABEL
O filme mais recente de Schnabel, "Miral", baseia-se em romance autobiográfico da jornalista palestina Rula Jebreal. É uma história épica que se estende desde os primórdios do Estado israelense até os dias atuais, acompanhando a trajetória de uma jovem.
Como nos filmes de Schnabel, as imagens são cruciais na narrativa: feiras, casas, até mesmo conflitos são retratados com uma proximidade ausente no noticiário. Talvez seja uma das poucas vezes que o público tem a oportunidade de conhecer a vida cotidiana na Palestina, marcada por uma série de dificuldades.
Além da jovem Miral, cuja personagem é baseada nas experiências da própria Jebreal, outras três mulheres participam da história: a mãe de Miral, sua tia militante e uma mulher que cria um lar e uma escola para garotas palestinas sem teto. Sabemos que, em algum momento, a sombra da intolerância e da violência vai se abater sobre esse mundo pacífico.
Quando isso acontece, é a humanidade dos personagens que ganha destaque. Todas essas forças estimulantes ajudam a moldar Miral, fazendo dela alguém com um futuro possível, mesmo que problemático.
Como é de imaginar, o filme suscitou muita polêmica. Tendo recebido a honra incomum de uma première no recinto da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, "Miral" foi criticado pelo Comitê Judaico Americano, que tentou impedir sua exibição.
Mas o filme foi projetado, e a sessão foi seguida por um debate com a participação de Schnabel, Jebreal, da jornalista palestina Mona Eltahawy, do rabino Irwin Kula e de Yonatan Shapira, cofundador da organização Combatentes pela Paz e ex-capitão da Força Aérea Israelense, que, em 2003, liderou um grupo de pilotos que se recusou a atacar os territórios palestinos. O poeta americano Frank O'Hara achava que apenas Walt Whitman, Hart Crane e William Carlos Williams eram melhores que o cinema. Julian Schnabel pode ter criado um filme tão bom quanto um dos poemas deles.


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