São Paulo, domingo, 03 de julho de 2011

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DIÁRIO DE BERLIM

Procura-se João Gilberto

E a celeuma em torno do "Jabuti" alemão

SILVIA BITTENCOURT

OUTUBRO DE 2010. O jornalista e escritor alemão Marc Fischer parte para o Rio com uma ambição: ver João Gilberto tocar para ele "Hô-bá-lá-lá", clássico da bossa nova.
Com um violão nas costas, Fischer passa cinco semanas na cidade tentando contatar o músico --missão quase impossível, considerando que ele vive há anos praticamente fechado num apartamento, negando-se a receber visitas e a dar entrevistas.
O jornalista segue rastros e visita lugares que Gilberto frequentou durante sua carreira, como o antigo bar Veloso, hoje Garota de Ipanema, e os hoteis de Copacabana em que se apresentou com a confraria bossanovista décadas atrás.
Além disso, fala com figuras importantes na vida do compositor: as ex-mulheres Miúcha e Cláudia Faissol, o ator e empresário Otávio Terceiro, os músicos João Donato e Roberto Menescal, entre outros.
Dessa busca saiu o livro "Hô-bá-lá-lá - Em Busca de João Gilberto", lançado em abril na Alemanha --a Cia. das Letras anunciou a aquisição dos direitos para o Brasil. A obra é um exemplo do gênero aqui conhecido como "popjournalismus", do qual Fischer é um dos expoentes: uma mistura de jornalismo e ficção, na qual o repórter é também personagem da trama, sem distanciar-se dela.
Ou seja: uma variante germânica do "jornalismo gonzo" popularizado nos EUA por Hunter S. Thompson. Segundo a Cia. das Letras, a inspiração declarada, entretanto, é o perfil de Frank Sinatra assinado pelo artífice do "new journalism", Gay Talese, sem trocar palavra com mr. Blue Eyes.
Fischer lançou mão do filtro ultrassubjetivo desde a década de 1980, quando ficou famoso entrevistando a cantora Björk em cima de um telhado.
"Hô-bá-lá-lá" é bossa nova pura, praia e alto astral, apesar da escalada de desespero do autor ao ver sua estada chegar ao fim sem conseguir sabatinar o músico. O único contraponto ao clima prazenteiro da narrativa parece ser o depoimento de Menescal, para quem João Gilberto não é flor que se cheire --quem se mete com ele costuma se dar mal.
Pouco antes do lançamento alemão de "Hô-bá-lá-lá", Fischer se matou, em Berlim, segundo a editora brasileira. Tinha 40 anos.
O número mais recente da revista "Serrote" (ims.uol.com.br) adianta quatro capítulos do livro.

PRÊMIO CONTESTADO O escritor alemão Friedrich Christian Delius (mais conhecido como F.C. Delius) recebeu há pouco o maior prêmio literário do país, o Georg-Büchner-Preis. A escolha foi polêmica. Em primeiro lugar, por que Delius é membro da academia responsável pela distinção.
Uma ala de críticos sugere que a instituição não teve muita opção, o que instaura um debate sobre o estado das letras alemãs contemporâneas. Outra vê na obra dele uma sobreposição da crítica sociopolítica à carpintaria literária.
Delius não gosta de ser classificado como um "autor político". Mas é fato que seus romances sempre têm como contexto episódios importantes da história recente da Alemanha, como as revoltas estudantis dos anos 60 e as ações terroristas na década de 70.
No Brasil, Delius ficou conhecido no fim dos anos 90 com o romance "As Peras de Ribbeck" (Nova Alexandria, 96 págs., R$ 26), em que mostrava, a partir da história de um vilarejo no leste do país, os conflitos entre alemães ocidentais e orientais depois da queda do Muro de Berlim, em 1989.

PASSADO A LIMPO Uma das autoras de HQs mais conhecidas no país, Isabel Kreitz, acaba de lançar a história alemã em quadrinhos. Em "Alemanha - Um Livro Ilustrado", a quadrinista, influenciada pelo traço e pela ambiência do americano Will Eisner (de "Avenida Dropsie"), se debruça sobre fatos políticos, culturais e econômicos desde 1949 --ano da fundação da República Federal da Alemanha.
A primeira visita do escritor Thomas Mann (1875-1955), até então exilado, à Alemanha do pós-guerra abre os trabalhos. A ela se seguem impressões sobre a vitória da Alemanha na Copa do Mundo de 1954, acerca da publicação de "O Tambor" (1959), de Günter Grass, e a respeito da vinda de Kennedy a Berlim (1963).
A quebra do banco de investimentos Lehman Brothers, que desatou a crise mundial em 2008, serve de arremate.
A perspectiva é, na maioria das vezes, a do cidadão comum, um pouco cético frente aos acontecimentos; é de uma autora germânica que se trata, pois. O resultado é uma aula de história original e divertida. Conheça mais sobre a produção dela em goethe.de/kue/lit/prj/com/cgp/cgk/ptindex.htm.


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