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São Paulo, domingo, 16 de março de 2003

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CONDOMÍNIO

Especialistas divergem sobre os novos poderes do síndico e da assembléia; advogado diz que está havendo má-interpretação

Polêmica, lei pune morador anti-social

ELENITA FOGAÇA*
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Aquele indivíduo inconveniente que mora no seu prédio, do tipo que sempre chega bêbado ou ofende os vizinhos com palavras e gestos obscenos, agora pode ser classificado como anti-social e multado em até dez vezes o valor do condomínio, de acordo com o novo Código Civil, já em vigor.
O que parecia ser uma solução simples e eficiente virou polêmica entre administradoras de condomínios, advogados, moradores e síndicos. As dúvidas vão desde a definição de "o que é comportamento anti-social" ao poder da assembléia de expulsar alguém ou do síndico, de penalizá-lo.
"O síndico não tem autonomia para aplicar a multa", diz Sergio Simões, presidente da Abami (Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário). Já José Roberto Graiche, presidente da Aabic (Associação das Administradoras de Bens, Imóveis e Condomínios), afirma que o síndico pode, sim, multar o anti-social.
O especialista em direito imobiliário Jorge Tarcha esclarece que o que está ocorrendo é a interpretação errada da lei: "O artigo 1.337 determina que o condômino que não cumpre com os deveres do condomínio, infringindo o que foi definido em convenção e o regimento interno, pode ser multado com um valor de até cinco vezes a taxa condominial".
"Nesse caso, estamos falando do morador inadimplente, daquele que faz barulho em horário proibido, que transita com cachorro pelo elevador social ou situações do gênero", esclarece. Para aplicar essa multa, a decisão tem de ser tomada em assembléia, na qual deverão participar e votar a favor 75% dos condôminos.
Já o comportamento anti-social só é citado no parágrafo único do artigo 1.337 e diz que "a pessoa que apresenta incompatibilidade de convivência poderá ser multada em dez vezes o valor do condomínio". Nesse caso, ressalta, "o síndico pode aplicar a multa, mês a mês, até a assembléia decidir pela suspensão da pena".
O relator final do novo Código Civil, o deputado federal Ricardo Fiúza (PPB-PE), tem um projeto que propõe mudanças em cerca de 200 itens, mas o artigo 1.337 não está incluído. "Ele é extremamente moderno e não precisa de alterações", defende Mário Delgado, seu assessor jurídico. "É completo, pois pune quem tem comportamento anti-social e quem não cumpre as obrigações do condomínio, além de fazer os moradores irem às assembléias."

Expulsão
O novo Código Civil não prevê expulsão do morador que não paga a taxa condominial ou que tem comportamento anti-social. "Mas a multa é tão severa que a pessoa se vê obrigada a deixar o imóvel para não perdê-lo", opina Delgado. Já a tomada do imóvel para hipotecar e quitar débitos com o condomínio continua garantida.
Ainda não há ações em trâmite nos tribunais de São Paulo valendo-se do novo artigo 1.337. Mas problemas de convivência com vizinhos são corriqueiros. Affonso Celso Prazeres de Oliveira, 64, síndico do edifício Copan (centro de São Paulo), onde moram mais de 5.000 pessoas em 1.160 apartamentos, afirma ter sido "forçado a criar leis próprias". O anti-social recebe multa de pelo menos um salário mínimo. "Em dez anos no cargo, expulsamos [via assembléia] dez moradores."
"Não vou aplicando multas à toa, faço uma profunda investigação para não cometer injustiças", diz. Moradora há cinco meses do Copan, a jornalista Karen Keller, 26, reclama de 2 das 3 penalidades que recebeu, de R$ 200 cada. "Eram injustas. Ele não adverte primeiro, já sai multando." Oliveira desconversa. "Ela [Karen" e a amiga têm de tomar juízo."


*Colaborou PATRÍCIA TRUDES DA VEIGA, editora de Suplementos


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