São Paulo, quarta-feira, 28 de abril de 2004

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ÍNDIOS NA REDE

Serviço que coloca em comunicação representantes de várias etnias tem recebido cerca de 700 acessos diários

Portal indígena critica ação de "brancos"

LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SALVADOR

Índios de sete etnias estão usando a internet para fazer reivindicações e criticar o governo federal, os fazendeiros e os "brancos". O canal usado por eles é o portal www.indiosonline.org.br, lançado oficialmente há uma semana.
"O Ibama proíbe quase tudo para nós. Mas, pagando gorjeta, um "branco" pode fazer tudo em nossas terras", escreveu o líder indígena Valdeleci Tupinambá, que mora em Olivença (BA). Outra atração do site é a sala reservada ao bate-papo, que reduziu as distâncias entre as nações.
Na sala, os erros ortográficos ficam em segundo plano. "O que nós queremos é fazer novas amizades, saber como anda a vida em outras nações, contar um pouco da história de cada um de nós. Não adianta falar corretamente o português e, em seguida, destruir o nosso passado, a nossa história, como os "brancos" fazem", disse a índia tupinambá Maria José Amaral, 43, que mora em Ilhéus (429 km ao sul de Salvador).
Para aprender a trabalhar com a internet, 14 índios de três Estados (Bahia, Alagoas e Pernambuco) participaram de um curso em Salvador, no início do mês. Depois, visitaram escolas públicas com mais de 15 mil alunos para contar as suas experiências.
As aulas foram realizadas em uma rua arborizada e sem calçamento de Itapuã (orla de Salvador), em um galpão. O portal começou a funcionar em caráter experimental na semana passada.
"Em média, estamos registrando 700 acessos diários", disse Luís Henrique Moreira, 38, responsável pelo desenvolvimento. Segundo ele, os sites indígenas brasileiros normalmente são atualizados por entidades. "Agora, os índios serão os redatores. Não existe nenhum tipo de censura."
"Em todo o país, há menos de cinco aldeias que têm computadores. O que fizemos foi uma coisa totalmente diferente. Doamos sete computadores para que os índios possam redigir as suas notícias, cobrar as suas reivindicações", disse o argentino Sebastian Gerlic, 34, presidente da Thydêwá, organização não-governamental responsável pelo projeto.
Além de um curso básico de 36 horas de informática, os índios também aprenderam dicas sobre sites -imagens, navegabilidade, texto e edição.
De acordo com Gerlic, as sete etnias que encaminharam representantes para Salvador -tupinambá, quiriri, pataxó-hã-hã-hãe, tumbalalá, cariri-xocó, xucuru-cariri e pancararu- têm cerca de 25 mil índios.
O presidente da organização não-governamental disse também que todas as aldeias ganharam uma antena para conexão 24 horas por dia a um satélite. "Assim, os índios terão internet de alta velocidade (banda larga) o tempo todo." Além dos computadores, cada etnia também recebeu uma máquina fotográfica digital. "Queremos ver as fotos produzidas pelos índios dentro das aldeias na internet. Não queremos nada produzido, queremos a realidade", disse Moreira.
De acordo com Sebastian Gerlic, o projeto está orçado em R$ 150 mil. Uma rede de estabelecimentos comerciais e um programa de incentivo cultural do governo baiano financiaram os computadores, os equipamentos fotográficos, as antenas e a instalação do portal indígena.
"Estou me comunicando com o mundo, ampliando os meus conhecimentos. Não é pelo fato de eu ser índio que devo viver sempre isolado", disse Antonio José dos Santos, 34, da etnia dos pancararus, que habitam o sertão de Pernambuco.


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