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DIÁLOGO COM NEGROPONTE
Previsões para o futuro
A partir de 15 de janeiro, minha
coluna passará a ser ocupada por
Esther Dyson, uma inovadora e
uma das vozes mais importantes
na evolução da era digital. Vocês
talvez a conheçam como editora
responsável por "Release 1.0", um
boletim informativo muito influente, e como autora do livro
"Release 2.0: A Nova Sociedade
Digital". Gostaria de acrescentar,
em plano mais pessoal, que se trata de uma colega muito talentosa
e que lhe desejo toda a sorte do
mundo.
Foi um enorme privilégio ver
todas essas questões de todo o
mundo. E tentar responder a elas
decerto me ensinou alguma coisa
sobre humildade.
Mas há sempre um momento de
parar -algo que se deve fazer
por vontade própria, quando se
está por cima, e não em queda. De
fato, acredito que o silêncio é a
mais forte das vozes. Parar também é uma maneira de reconhecer quão pouco eu sei e quanto
trabalho ainda há por fazer
-antes que eu conquiste de novo
o direito de falar, falar, falar.
Para esta última coluna, portanto, tomei a liberdade de fazer
as perguntas eu mesmo -e de
tentar oferecer algumas respostas
ou, se preferirem, algumas respostas bastante imperfeitas.
Pergunta - Onde haverá mais
computação na minha vida cotidiana no futuro?
Resposta - No futuro, a maior
parte dos computadores estará
invisível, escondidos em objetos
cotidianos comuns. Hoje temos a
imagem de um laptop, ou um
computador pessoal -uma caixa. Dedicamos atenção muito estreita a ele; nós o ligamos e o desligamos, e ele executa programas
complexos para finalidades especiais.
Em contraste, os computadores
do futuro terão natureza mais
molecular e estarão entrelaçados
(literal e metaforicamente) em tecidos e incorporados a pequenos
objetos. Estarão sempre ligados e
se comunicando uns com os outros, para formar uma sociedade
de máquinas.
Nesse tipo de grupo, a inteligência será um comportamento coletivo, mais parecida a uma colônia
do que a uma caixa preta isolada.
E os objetos conectados uns aos
outros e recebendo sua inteligência da net podem surpreender. De
fato, em pouco tempo, bonecas
Barbie -como muitos outros
brinquedos- poderão se comunicar umas com as outras via Internet.
Pergunta - É evidente que há
mais pessoas conectadas à Internet do que os especialistas
dizem. Por que as estimativas
de ciberuso são tão baixas em
termos de número de pessoas?
Resposta - Hoje em dia, muitos
especialistas em previsões dizem
que, caso façam uma previsão errada, é porque ela é conservadora
por natureza, e que isso é melhor
do que aparentar ter inflado os
números.
Eles podem estar envolvidos na
preparação de relatórios corporativos. Ou oferecer citações a jornalistas que precisam de idéias
sobre as tendências na indústria
de computadores e estimativas
quanto a uso futuro. Dependendo
da questão, profecias podem ser
complicadas.
Mas eu concordo que isso não
explica totalmente a distância entre a ciberrealidade e as ciberestatísticas. Os especialistas estão enganados por margens muito vastas.
Nenhum de nós, especialistas
incluídos, consegue compreender
realmente o que é crescimento exponencial. É difícil realizar previsões em uma área em que o crescimento pode, por exemplo, duplicar a cada seis meses. Extrapolar em termos lineares é muito
mais fácil -simplesmente projetamos os números relativos ao futuro de acordo com os dados obtidos sobre o passado.
Os especialistas em previsões
também erroneamente subestimam o uso de computadores nos
países em desenvolvimento, onde
as pessoas compartilham máquinas, empregam computadores
oferecidos em lugares públicos e,
por puro desespero, tendem a ser
muito audaciosas quanto ao alcance de suas explorações -muito mais do que os membros de
uma sociedade de gente satisfeita.
Dentro de um ano, a Internet
terá 1 bilhão de usuários, e o comércio eletrônico estará faturando US$ 1 trilhão. Ninguém disse
isso ainda, mas podem confiar
em mim -estejam atentos ao
ano 2001.
Pergunta - A despeito dos issos e aquilos digitais que dispomos no mundo hoje em dia, há
muitas pessoas no mundo que
são ciberidiotas. Certamente
você não pretende negar o fato.
Explique o motivo.
Resposta - Concordo com você.
Quem comumente lê minha coluna sabe que estou do seu lado. Os
criadores de softwares nas empresas, e até mesmo fora delas, têm
em mente mais eles mesmos do
que você. Tentando se manter em
dia, você pode algumas vezes descobrir nove maneiras diferentes
de fazer a mesma coisa, cada qual
mais confusa. Todo tipo de recurso e opção, sem grande ordem, foi
colocado no mercado só porque é
divertido fazê-lo.
O que aconteceu foi que, ao longo dos últimos dez anos, os computadores se tornaram mais fechados, ou seja, mais difíceis de
usar, em lugar de mais fáceis. De
fato, se, em 1989, eu tivesse dito a
você que boa parte do público geral em breve estaria gastando dinheiro em uma máquina que
prometia levá-los às lágrimas por
pura frustração, pelo menos uma
vez por semana você me chamaria de maluco. No entanto, como
você diz, é exatamente isso o que
está acontecendo.
O pior é que essa obesidade e
complexidade do software abalou
a confiabilidade dos computadores pessoais, porque os programas
tropeçam uns nos outros. Há coisas que parecem funcionar um
dia e pifam no seguinte.
Isso pode melhorar? Sim, pode.
Vai melhorar? Acredito que não
haja outra escolha.
Pergunta - Em termos de corporações, e particularmente na
era cibernética, qual é o valor
de ser grande (além de fazer
com que nós, usuários, nos sintamos pequenos...)?
Resposta - Muito pouco. No
passado, uma empresa multinacional costumava ser encarada
como uma companhia imensa,
prodigiosa -muito grande. Mas
hoje dois moleques em uma garagem podem dirigir uma empresa
mundial -a clientela deles pode
não estar na mesma cidade, Estado ou em outro continente. O
mais provável é que ela seja global. Os mercados mundiais não
estão mais limitados a empresas
gigantes. Aliás, o que está?
Anos atrás, eu costumava pensar que uma vantagem inalienável de ser grande era a capacidade de perder milhões de dólares
antes de começar a lucrar ainda
mais. Isso, para mim, parecia ser
a verdadeira virtude do tamanho. Você e eu, como pequenos
indivíduos, não podemos começar uma empresa cujo custo de
entrada seja alto ou cujos prejuízos iniciais sejam altos demais
antes que lucros ainda maiores
surjam. Mas até mesmo essa vantagem do tamanho está começando a desaparecer à medida que
mais investidores e mercados passam a assumir mais riscos e dão
sustentação a empreendimentos
compactos e de alto custo.
A comunidade de investimento
atual -tanto os mercados quanto os banqueiros de investimentos- está disposta a arriscar capital suficiente para que empresas iniciantes de qualquer tamanho se envolvam em projetos dispendiosos. Basta ver algumas das
novas companhias de telecomunicações criando redes maciças
de fibras ópticas em todo o mundo.
Na verdade, subitamente quase
desapareceu a vantagem de ser
grande, o que é uma tendência
bastante surpreendente.
Pergunta - Bem, coloque seu
chapéu de profeta e diga qual é
a próxima novidade quente do
mundo digital.
Resposta - Computadores comestíveis. Juro. No futuro não
muito distante do século 21 estaremos todos engolindo um computador descartável do tamanho
de um comprimido, que se moverá dentro do nosso corpo. Ele
transmitirá nossos sinais vitais a
uma pequena caixa preta armazenada em um cinto ou relógio de
pulso. Engoliremos um computador por dia.
Fico atônito diante da nossa
falta de conhecimento sobre o
nosso próprio corpo. A Boeing sabe mais sobre os seus aviões do
que os seres humanos sobre os
seus corpos. O genoma humano é
muito importante. E o mesmo vale para acompanhar o nosso desempenho e criar uma conexão
com as nossas funções internas.
Será um verdadeiro anacronismo ir ao consultório médico tentando explicar a origem de uma
dor e quando ela ocorreu, e onde
foi, e quanto durou, que sensações causou. Em lugar disso, o que
sentirmos estará gravado na pequena caixa preta, que será dada
ao médico para que ele ganhe
completo conhecimento sobre o
nosso estado de saúde.
Nicholas Negroponte é autor do best seller "A Vida Digital" e diretor do Laboratório de Mídia do Massachusetts Institute of Technology (MIT).
O autor se despede da coluna "Diálogo com Negroponte", que passa a ser escrita por Esther Dyson. O endereço para correspondência é a/c New
York Times Syndicate,122E 42nd St., NY, NY 10168 ou por fax, 001-212-499-3382.
Tradução de Paulo Migliacci.
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