São Paulo, domingo, 01 de julho de 2007

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Três listras e uma ambição

Empresas alemãs mudaram a face do esporte ao criar e disseminar o patrocínio e o merchandising

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR DE ESPORTE

Antes do Vale do Silício e dos japoneses, quem inventava coisas neste mundo eram os alemães.
Da bomba atômica ao Fusca, boa parte do século 20 surgiu de alguma cabeça que pensava em alemão. Aparentemente, no esporte não foi diferente, revela a jornalista Barbara Smit, em "Invasão de Campo".
Os Dassler não inventaram nenhuma modalidade, mas inventaram tudo o que hoje cerca o setor: patrocínio, merchandising, direitos de imagem, de comercialização e até os de TV.
Tudo movido por uma disputa entre dois irmãos, que mais tarde se transformou numa disputa entre pais e filho, irmão e irmãs, primo e primo e que quase terminou em nada.
Um enredo cinematográfico, com locações e personagens espetaculares -Jesse Owens /, Puskas, Pelé, Muhammad Ali /, Cruyff, Kareem Abdul-Jabbar /, Mark Spitz /, Franz Beckenbauer, para ficar apenas em unanimidades.

Livre trânsito
Horst, filho de Adi, o lado Adidas da história, é de longe o Dassler mais fascinante. Poliglota, sóbrio, obsessivo e paranóico, começou a atuar na Olimpíada de Melbourne /, em 1956.
Aprendeu com os pais a tratar atletas com leite de pato, mas logo trocou os familiares chás da tarde na pequena Herzogenarauch por jantares suntuosos. Tinha uma das adegas mais caras da Europa em um hotel particular na Alsácia.
Horst, descreve o livro de Smit, trabalhava como um diplomata profissional. Atravessava a Cortina de Ferro com impensável facilidade e era espionado pela CIA e pela Stasi.
Convencer atletas (ainda amadores) a usar equipamento Adidas, com ou sem dinheiro, era só uma parte da história. Horst concluiu rapidamente que o negócio era começar por quem mandava.
Os alvos eram dirigentes, confederações e até políticos de pequenos países -qualquer um que tivesse direito a voto em qualquer pleito.
E, de voto em voto, o amadorismo foi acabando, contratos de exclusividade e patrocínio foram sendo assinados e o esporte virou moderno, virou negócio.

Empresa tentacular
Com tudo isso, Horst ganhou tanto poder que a Adidas do pai, a que vendia calçados e estranhava fazer roupas com a marca, ficou pequena perto da Adidas do filho -na verdade, a subsidiária francesa. E esta secretamente se transformou em uma tentacular empresa, que engolia rivais, criava marcas e, última fronteira, criou um novo negócio, os direitos de televisão.
Pena que o livro não avance muito nesse último campo. Detalhes da criação da ISL, a relação com João Havelange e o plano de poder sobre o esporte mais popular do mundo estão lá.

Prato cheio
Mas a crise da agência, nos anos 90 -com Horst já morto-, e sua falência restam como história a ser contada (provavelmente com um capítulo especial para o futebol brasileiro, de causar arrepios nos cartolas locais).
Para quem gosta de esporte, é um prato cheio, um grande quebra-cabeça de nomes, feitos e eventos que contam como uma atividade excêntrica se transformou, ao longo de um século, em algo global e bilionário.



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