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EUROPA
Templo dos migrantes
Na Europa, organização cresce ao investir em comunidades de brasileiros e africanos
LUCIANA COELHO
DE GENEBRA
A Igreja Universal do
Reino de Deus
avançou na Europa
capturando oportunidades que surgiram com a crise financeira.
Empreendedorismo e recolocação profissional são hoje o
principal foco de sua atuação.
Sob vários nomes, a igreja
-que na Europa é comumente
chamada "centro de ajuda"-
diz estar em 14 países do continente, do óbvio Portugal, sede
do braço midiático da Universal, à inusitada Romênia.
Sua forma de atuação se assemelha mais a uma rede de
franquias do que a uma multinacional coesa. Mas o faro para
necessidades locais é uma
constante. Em Portugal e na
Espanha, onde as taxas de desemprego estão no pico, oferece workshops de capacitação
profissional. Na Inglaterra,
tem um centro de recolocação.
"É assim que eles estão avançando entre outras classes sociais [mais altas]", diz a socióloga portuguesa Helena Vilaça,
da Universidade do Porto, que
pesquisa minorias religiosas.
Expoente disso é o presidente da Record Internacional,
Aroldo Martins, guru motivacional e pastor licenciado cuja
página na rede social Facebook
anuncia palestras e livros que
investem na autoconfiança.
Ir ao culto também significa
fazer parte de uma rede social.
É ali que as pessoas buscam
trabalho, clientes, ajuda, apoio
e acabam prosperando.
Um brasileiro em Genebra,
que não quis se identificar,
conta que uma amiga passou a
frequentar o culto em Zurique
em busca de clientes para sua
agência de remessas financeiras. "Depois que ela começou a
ganhar dinheiro, virou devota."
"Eles [a Iurd] estão muito
sintonizados com os problemas modernos", frisa Vilaça.
A transição para essa fé é facilitada pela adoção de símbolos de outras religiões. "Há um
conjunto de rituais que não estão longe da religiosidade popular. Eles falam contra imagens de santos, mas usam
águas e óleos bentos. É fascinante, é um paradoxo", diz ela.
Terapia em grupo
Num culto em português em
Genebra -há também em francês, voltado aos imigrantes africanos-, o tom é de terapia em
grupo. Fiéis e pastor trocam
histórias familiares. Para mulheres de meia-idade, o discurso citava filhos rebeldes e maridos distantes.
"A igreja acaba oferecendo às
pessoas um lugar para liberar
tensões ao qual de outra forma
elas não teriam acesso", explica
Vilaça. O pastor Antonio, em
Genebra, deixa claro: "Em vez
de incomodar seu vizinho, incomode Deus". O discurso cai
divinamente para imigrantes
latinos em uma sociedade em
que individualismo e privacidade são mais valorizados do que
naquelas de onde vêm.
O dízimo é pregado quase como um plano de seguro-saúde
versão milagre: você não é obrigado a pagar, mas sabe que pode precisar um dia.
"Benditos os que creem antes
de ver", grita Antonio, pontuando a pregação com histórias bíblicas de devotos que deram o que não podiam e receberam milagres em troca. "É importante dar o dízimo mesmo
quando você não tem, porque
dar o que tem é fácil."
A ex-costureira e hoje babá
Maria da Graça, 61, acha que no
dia em que parar de ir ao culto
sua vida afundará, como aconteceu há 15 anos, quando procurou a Iurd em Osasco (SP).
"Estava no fundo do poço, fui
morar numa favela", diz. Desde
2006 ela vive em Genebra, em
apartamento que aluga sozinha, e trabalha como babá apesar de seu francês parco. A filha
Tânia casou-se com um suíço
ateu e trabalha no McDonald's.
Maria da Graça acha que é tudo
obra divina. "Até a sogra da minha filha admite que a religião
faz bem a ela e respeita", sorri.
"Sabe, aqui na Europa é todo
mundo criado para ser ateu."
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