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PONTO DE FUGA
A lição da modéstia
JORGE COLI
especial para a Folha
Uma exposição na Bienal de Arquitetura do ano passado e o recente livro, denso e afetuoso, de Hugo Segawa (Pro Editores), começaram a evidenciar a obra de Oswaldo Bratke. Ele morreu em 1997, com 90 anos. Foi um dos nossos grandes arquitetos e o mais discreto. Num tempo em que o cimento armado triunfava como expressão do moderno, seus projetos revelavam uma atenção cuidada ao sítio, à paisagem, à natureza, aos materiais diversificados e acessíveis. Enquanto muitos de seus ilustres colegas impunham formas espetaculares e indiscutíveis, que atingiam facilmente o irracionalismo, ele dialogava e mostrava-se atento aos desejos dos usuários. Bratke tinha horror das teorias, dos gênios e do "culto ao ego" -são suas palavras- em arquitetura. Preferia Wright ou Neutra a Le Corbusier. A beleza delicada e sensível de suas obras emana do ambiente, quase imperceptível, junto a um certo sentimento de bem-estar ou, mais, de felicidade. Basta passear pelo balneário de Águas de Lindóia, por exemplo, para se perceber que o edifício tende a dissolver-se em leveza, a evidenciar a luz, as plantas ou os admiráveis painéis de Lívio Abramo, seu velho cúmplice: o avesso da arquitetura autoritária que dominou nossa modernidade.
VIOLONCELO - O catalão
Casals, na primeira metade do
século, e o russo Rostropovich,
na segunda, foram os dois violoncelistas insuperáveis de nosso tempo, com vidas, por sinal,
bastante paralelas, pelo menos
no que concerne ao empenho
político de ambos, que ficaram
exilados por longos anos.
O violoncelo de Casals possuía um som terrivelmente negro e doloroso, o de Rostropovich chega a uma espécie de
erotismo aveludado. De Casals,
quase tudo foi editado em CD.
Rostropovich selecionou agora
suas gravações realizadas entre
1950 e 1974, quando vivia na
ex-União Soviética. Elas couberam num álbum de 13 CDs
(EMI). Das "Bachianas nš 1"
aos dois concertos de Chostacovich, passando por Schumann e
Beethoven, cada obra parece
pertencer às preliminares sonoras do paraíso.
FOSCA - Até bem recentemente não se tinha uma gravação completa da segunda ópera
italiana de Carlos Gomes, obra
complexa, que encerra um intrincado cruzamento de sensibilidades culturais e musicais.
Existem agora duas: uma histórica, editada já há alguns
meses pelo selo Master Class,
tomada ao vivo, mas com ótima restauração sonora e com o
trunfo de intérpretes como Ida
Miccolis e Agnes Ayres.
A outra "Fosca", gravada em
novembro passado a partir de
um espetáculo também ao vivo, na Bulgária (Sudameris/Funarte/MC), possui suntuosa qualidade de som, bons
cantores e, sobretudo, regência
de Luiz Fernando Malheiro,
maestro que sabe exatamente o
que dirigir uma ópera significa. Ambas as versões são indispensáveis.
HUMANA FRAGILIDADE -
Um espetáculo perfeito percorre atualmente o Brasil: "A Breve Interrupção do Fim", de
Suely Machado e Gerald Thomas. O cenário poético e a presença da trilha sonora envolvem os atores-dançarinos, que
não poderiam ser melhores. Há
uma surpreendente alternância de humor e comoção, passando de um ao outro sem modular. Tudo ocorre num tom de
leveza constante que faz transparecer a inocência trêmula da
humana fragilidade.
Jorge Coli é historiador da arte.
E-mail: coli@correionet.com.br
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