São Paulo, domingo, 08 de julho de 2007

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Liberdades condicionais

Duas obras enfocam os movimentos de independência e a construção das nacionalidades no Brasil e nos países vizinhos

JEAN MARCEL CARVALHO FRANÇA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há pelo menos duas décadas, pouco mais, pouco menos, a historiografia brasileira tem demonstrado um crescente e robusto interesse pelas dimensões sociais e culturais da Independência do Brasil. Daí, em grande medida, a atenção que tem merecido dos historiadores o lento e sutil processo de construção da nacionalidade brasileira, processo que antecede e ultrapassa o "grito do Ipiranga".
Paralelamente a esses novos interesses, muitos pesquisadores do tema têm se rendido às virtudes analíticas da história comparada e, cada vez mais, buscado no conhecimento dos diversos movimentos de independência e de construção das nacionalidades das Américas subsídios para compreender não somente os meandros do caso brasileiro mas também suas semelhanças, diferenças e relações com esses outros casos.

Brasil, Argentina, Uruguai...
Uma boa amostragem dos resultados a que tem chegado essa historiografia recente pode ser vislumbrada em duas obras que acabam de ganhar as livrarias: "Revoluções de Independências e Nacionalismos nas Américas" e "A Independência Brasileira - Novas Dimensões".
A primeira, organizada pelos historiadores Marco A. Pamplona e Maria Elisa Mäder, é o volume inicial de uma coleção que contará com mais quatro volumes e com a colaboração de pesquisadores de diversos países do continente americano.
Será dedicada a mapear as "revoluções de independência" e os processos de construção das nacionalidades nas Américas.
A outra, organizada pelo historiador Jurandir Malerba e que inclui a participação de historiadores brasileiros, norte-americanos, ingleses e portugueses, é uma coletânea de ensaios cujo intuito é oferecer ao leitor um panorama das reflexões de uma "nova geração de historiadores" sobre o tema da Independência.
"Revoluções de Independências..." é composto por cinco ensaios, todos voltados para a análise dos processos independentistas da região do Prata e do Chile -os volumes posteriores abordarão outras regiões do continente.
O leitor encontrará aí contribuições que vão desde uma análise da construção das "identidades coletivas" na República Oriental do Uruguai -lócus privilegiado do cruzamento dos mundos hispano e luso-americano- a uma descrição das formas que tomou o nacionalismo no romantismo argentino, passando por três abordagens de diferentes aspectos da emergência dos "imaginários" nacionais chileno e argentino.
Os ensaios são seguidos por um documento pertinente ao tema analisado e, ainda que não tenham todos o mesmo nível de clareza e interesse, cumprem bem o papel de introduzir o leitor no universo hispano-americano -que, malgrado a proximidade geográfica, é pouco familiar ao público brasileiro.
"A Independência..." é uma coletânea de ensaios estruturada de maneira competente e que, coisa que vem se tornando rara nesse gênero de obras derivadas de congressos -muitíssimo em voga ultimamente-, reúne ensaios com uma qualidade bastante homogênea.
Trata-se, contudo, de uma obra especialmente interessante para o público não-iniciado ou que está se iniciando no tema, à medida que a maioria dos ensaios que vincula deriva de livros já publicados pelos respectivos autores.
A coletânea, dividida em quatro partes -dos antecedentes da Independência a seus desdobramentos imediatos-, abre com uma informativa introdução do organizador, na qual o leitor encontrará um balanço da produção historiográfica das últimas décadas sobre a independência.
Dos 11 ensaios que compõem a obra, destacam-se pelas suas virtudes analíticas: o texto de João Pinto Furtado, sugestivamente intitulado "Das Múltiplas Utilidades das Revoltas", analisando os movimentos sediciosos mineiro, carioca e baiano, que tiveram lugar no Brasil no último quartel do século 18; o estudo de Isabel Lustosa sobre os contornos da imprensa entre 1821 e 1823, uma imprensa virulenta e sem muitas medidas; a bem documentada avaliação que o pesquisador Hendrik Kraay promove dos movimentos populares baianos, ocorridos entre 1820 e 1825; e o ensaio de encerramento do livro, assinado pelo inglês Anthony McFarlane, onde o leitor encontrará uma análise comparativa de algumas experiências independentistas das Américas.

Caráter introdutório
Ambas as obras, como referido, têm caráter introdutório, mas desempenham com competência esse papel.
Para mais, não obstante pertencerem a um gênero -as coletâneas acadêmicas- que vêm apresentando nítidos sinais de saturação e de perda de qualidade, os títulos em questão contam com um nível e com uma estruturação superiores à maioria das obras similares entornadas no mercado ultimamente.

JEAN MARCEL CARVALHO FRANÇA é professor de história na Universidade Estadual Paulista, em Franca (SP), e autor de "Literatura e Sociedade no Rio de Janeiro Oitocentista" (Imprensa Nacional/Casa da Moeda).

REVOLUÇÕES DE INDEPENDÊNCIAS E NACIONALISMOS NAS AMÉRICAS


Organização:Marco Antônio Pamplona e Maria Elisa Mäder
Editora:Paz e Terra (tel. 0/xx/11/ 3337-8399)
Quanto:R$ 35 (304 págs.)


A INDEPENDÊNCIA BRASILEIRA - NOVAS DIMENSÕES

Organização:
Jurandir Malerba
Editora:FGV (tel. 0/xx/21/ 2559-5543)
Quanto:R$ 42 (432 págs.)



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