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"Raízes do Brasil"
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Entre as obras que mais me marcaram está "Raízes
do Brasil". Ali, Sérgio Buarque de Holanda foi
mais do que um intérprete da formação nacional.
Denunciou as marcas da herança colonial nas estruturas sociais e na psicologia coletiva do Brasil. O "homem cordial", personificação de uma aversão generalizada a regras impessoais, constituía um obstáculo à afirmação das práticas e dos valores da democracia entre
nós. Mas Sérgio Buarque também antecipou novos rumos. "Raízes do Brasil" fala da transição não-linear que
estaria em curso desde a abolição da escravatura.
Trincadas as estruturas de poder do Império, a República oscilava ainda entre o beletrismo liberal e um "mussolinismo indígena". Sérgio Buarque percebia o peso da
ameaça autoritária e o insuficiente contrapeso oferecido
por um liberalismo elitista e conservador. Via o Brasil
deslizar na direção do autoritarismo. Mas apostava que a
democracia haveria de prevalecer. Ressaltou, nesse passo, atributos positivos da nossa cultura, como o cosmopolitismo e o apreço pela autonomia do indivíduo. Enxergava, no entanto, o ingresso das massas no processo
político como a garantia maior da democracia.
O Brasil é hoje um país urbano, no usufruto do Estado
de Direito, com ampla participação popular na vida política. Nem por isso o clássico de Sérgio Buarque perdeu
sua atualidade. Ele é o nosso Tocqueville. Apresenta a democracia como um processo aberto, indeterminado. Coloca em pauta a necessidade de atualizar valores como a
impessoalidade da lei, a primazia das instituições, a soberania popular. Por isso a leitura de "Raízes do Brasil" traz
sempre algo de novo.
Fernando Henrique Cardoso é sociólogo, autor de "A Democracia
Necessária" (Papirus) e "As Idéias e Seu Lugar" (Vozes), entre outros.
Foi presidente da República entre 1995 e 2002.
A obra
"Raízes do Brasil", de Sérgio Buarque de Holanda, 224 págs., R$
34,50. Cia. das Letras (tel. 0/xx/11/ 3707-3500).
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