São Paulo, domingo, 13 de junho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Arthur Omar

1. Interromper todas as ações cuja origem se perdeu. E re-intuir as palavras-chave repetidas mecanicamente. Sonhei com isso em 5/1/2004.
2. Descer mais fundo na noite, absorvendo seus personagens, até de manhã. Depois, entreter meus hóspedes com histórias extraordinárias.
3. Ter mais dois filhos, um casal. Ela se chamará Roma (anagrama de Amor e Omar). Ele se chamará Tigran. Um será educado na barbárie, o outro, na civilização. Duas coisas que nunca tive completamente.
4. Possuir minha própria estação de rádio na internet, dedicada à música lenta. Trechos lentíssimos, extraídos de peças experimentais, clássicas, orientais ou eletrônicas, se sucederão em ordem randômica, criando uma atmosfera rarefeita e cheia de surpresas. Não se saberá quando começa uma música, quando acaba outra.
5. Abraçar uma caixa acústica numa festa rave e sentir a pulsação nos ossos cranianos, até virar buda. De lá, telefonar para mim mesmo, avisando-me que não vou voltar nunca mais para casa.
6. Dedicar-me à caligrafia, seguindo as lições do tratado "The Universal Penman", de George Bickham (Londres, 1740). Um bom calígrafo consegue fazer com que o pensamento siga o movimento das mãos. Suas idéias surgem de um desejo dos dedos. O corpo pensa por ele coisas que ele sozinho não pensaria.
7. Emoldurar todos meus 14.732 desenhos, acabando com o lado secreto da minha atividade artística. Meus filmes, livros e fotografias serão apreciados e interpretados à luz desses desenhos, porque é de lá que tudo saiu.
8. Ser o benfeitor anônimo de alguém. Como nos melodramas. Todo mês depositar uma quantia em sua conta. Jamais revelar minha identidade. Viver intensamente essa distância paradoxal que aumenta à medida que o outro se aproxima de nós.
9. Nascer de novo. Não quero a imortalidade ou a vida eterna. Apenas vou nascer de novo, sentir o gozo de uma segunda vez. Quero experimentar a singularidade desse "de-novo" que existe no nascer de novo. Não precisa haver uma terceira vida. A repetição é suficiente.
10. Não posso dizer aqui. Assim, pulemos o último item.
Arthur Omar é artista plástico e tem diversos livros de fotografia lançados, como "Antropologia da Face Gloriosa" (Cosac & Naify).


Texto Anterior: Carlos Reichenbach
Próximo Texto: Tata Amaral
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.