São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 2009

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+(c)ultura

Corbusier em aberto


Figura central do urbanismo e da arquitetura do século 20, suíço tem seu legado revisto em dois livros


FRÉDÉRIC EDELMANN
Ele nunca conheceu realmente o purgatório, protegido pelo "cofre de segurança" da fundação Le Corbusier, cujo projeto o próprio arquiteto lançou antes de sua morte, em 1965, e também por um exército de discípulos que defenderam sua obra e aquilo que se convencionou chamar de seu pensamento.
Quarenta e quatro anos se passaram desde o enterro de "Corbu" e a célebre homenagem que André Malraux lhe fez na ocasião. E, fenômeno estranho, as obras sobre ele se multiplicam, como se fosse questão de fazer uma fênix renascer das cinzas. O melhor e o pior.
Muitas pessoas se atêm a uma obra (La Tourette, Firminy), outras, a uma tipologia, como a do habitat.
Dois autores, cada um à sua maneira, tentaram fazer reviver o personagem complexo, normalmente louvado por sua obra construída e detestado por suas recomendações urbanas, que concretamente permaneceram no domínio do discurso, mas que serviram de guia ou de álibi a muitos construtores mais preocupados com a quantidade (era o período do pós-guerra) que com a qualidade de vida.
"C'Était Le Corbusier" [Era Le Corbusier, Ed. Fayard, 976 págs., 35, R$ 91], de Nicholas Fox Weber, é uma primeira tentativa de penetrar em uma parte, pelo menos, da intimidade do arquiteto nascido em La Chaux-de-Fonds, na Suíça, não muito longe da França, que se tornaria sua pátria de adoção. Já o lançamento de "Le Corbusier" [ed. La Quinzaine Littéraire, Louis Vuitton e fundação Le Corbusier, 346 págs, °26, R$ 67], conjunto de textos escolhidos e apresentados pelo historiador Philippe Duboy, traz à tona um outro lado do arquiteto, complementar e, sob muitos aspectos, novo. Reúne textos publicados em revistas de 1911 a 1947 e nunca republicados desde então.
O trabalho de Fox Weber revela as facetas múltiplas de Le Corbusier, o homem -suas relações com os pais, as dificuldades com as mulheres, com a exceção de Josephine Baker.
Mas não faz mais do que roçar a superfície de seu trabalho e seu pensamento de arquiteto, justamente o que é preciso para compreender o que transformou o pequeno suíço em gênio. Já Philippe Duboy deixa a palavra ao interessado.

Discurso póstumo
Isso pode ter sido um risco: Corbu efetivamente organizou sua posteridade editorial e biográfica, de tal maneira que ele aparece como um teórico e crítico que chega aos limites do dogmatismo.
Isso cria uma espécie de vínculo forçado entre o arquiteto e o urbanista e faz o homem parecer ainda mais dogmático do que foi de fato em sua vida pública. Relidos por Duboy, esses textos epistolares intimistas mostram um homem atento a todas as formas de vida, de construção, de paisagem.
E, se uma certa brutalidade se manifesta em alguns momentos, sua sensibilidade é a riqueza do livro.
Mas nem Duboy nem Fox Weber esgotam o tema. Apenas a Fundação Le Corbusier, com razão, conseguiu reunir uma parte considerável da obra: 34 mil plantas, estudos e croquis digitalizados graças ao apoio de duas empresas japonesas e publicados em 2005 em 16 DVDs (www.lecorbusierplans.com), pelo valor nada desprezível de 5.800 [R$ 15 mil].


A íntegra deste texto saiu no "Le Monde". Tradução de Clara Allain.

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