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À espera de um milagre
Eutanásia e suicídio assistido refletem
"niilismo insalubre",
diz especialista em bioética
EUCLIDES SANTOS MENDES
DA REDAÇÃO
Crítico feroz da eutanásia e do suicídio
assistido, Wesley J.
Smith, especialista
em bioética do instituto de pesquisa norte-americano Discovery, avalia que a regulamentação legal dessas práticas em Estados norte-americanos (Oregon e Washington) e
em países europeus (Suíça, Holanda, Bélgica e Luxemburgo)
compromete a oferta de serviços de assistência médica a
doentes terminais.
"A legalização traz à tona o
mais considerável risco de
coerção e abandono", alerta.
Para ele, a regulamentação
não apenas interfere na qualidade dos tratamentos paliativos como pode levar os pacientes à depressão e ao medo.
"Estou convencido de que a
legalização do suicídio assistido transforma a cultura e a maneira como nós percebemos o
valor do enfermo, do deficiente
e do idoso."
"Ele também questiona a
igualdade humana, porque cria
a casta das pessoas consideradas descartáveis", conclui.
Autor de "Forced Exit - Euthanasia, Assisted Suicide and
the New Duty to Die" (Saída
Forçada - Eutanásia, Suicídio
Assistido e a Nova Responsabilidade para Morrer, Encounter
Books, 350 págs., U$ 12,82, R$
23), Smith critica, em entrevista à Folha, associações como a
Dignitas e o que chama de "indústria do turismo suicida".
FOLHA - O sr. conhece a Dignitas? O
que pensa a respeito do suicídio assistido e da eutanásia?
WESLEY J. SMITH - Dignitas é uma
entidade que ajuda suicidas por
um preço. A indústria do "turismo suicida", da qual faz parte, é
ligada a Jack Kevorkian [médico americano conhecido como
"Dr. Morte", por ter declarado
que ajudou 130 pessoas a se suicidarem, entre 1990 e 1998,
praticando a eutanásia].
A Dignitas não existe para
ajudar outras pessoas, tratá-las
sob o ponto de vista médico ou
encontrar maneiras de aliviar
suas dores. Existe para ajudá-las a morrer. É a pior forma de
abandono.
FOLHA - O que o sr. pensa sobre a
legalização da eutanásia e do suicídio assistido nos EUA e na Europa?
SMITH - Eu me oponho à legalização em todos em casos. Acho
que a situação é ainda pior na
Holanda, onde a eutanásia ativa é permitida.
De fato, lá existem médicos
que praticam eutanásia em bebês que nascem com deficiências sérias. Uma vez que a porta
está aberta, torna-se muito difícil controlar.
Considere também o potencial para utilizar a eutanásia como uma maneira de economizar dinheiro na medicina. A legalização traz à tona o mais
considerável risco de coerção e
abandono.
FOLHA - Como tal risco advém?
SMITH - Basta olhar o caso dos
cuidados paliativos. Advogados
dizem que são melhorados
-apontando para o bom histórico em Oregon.
Quando [o Estado norte-americano de] Rhode Island
determinou a ilegalidade do
suicídio assistido, mas esclareceu que o controle de uma dor
agressiva era legal, a qualidade
dos cuidados paliativos subiu
dramaticamente.
Na Holanda, vários estudos
mostram que a qualidade dos
tratamentos paliativos é pior
do que em outros países equivalentes.
Ativistas de direitos de portadores de deficiências são quase
unânimes em se opor ao suicídio assistido porque coloca esses pacientes em considerável
risco.
A ideia [do suicídio] lhes sugere que suas vidas são
menos dignas de existirem,
conduzindo-os à depressão e ao
medo.
Isso leva a sociedade a olhar
de cima o doente e o portador
de deficiência, a percebê-los
como "cargas" ou pessoas que
não beneficiam a sociedade. Isso pode provocar naquele que
sente dor ou está muito doente
uma pressão para "escolher" o
suicídio assistido.
Contudo, estudos mostram
que, quando a prevenção adequada é oferecida, mesmo os
mais doentes ou deficientes
com propensão ao suicídio mudam frequentemente de ideia.
FOLHA - Como é a burocracia da
morte por eutanásia ou suicídio assistido nos Estados norte-americanos onde é permitida?
SMITH - O passo a passo burocrático é para criar alguma forma de controle. Mas não há um
controle real.
Em Oregon, por exemplo, se
um médico diz não, o paciente
pode procurar outro. Quase todos os casos de suicídio assistido lá são facilitados pela Compassion and Choices [Compaixão e Escolhas], um grupo de
defesa do suicídio assistido.
Frequentemente, os médicos
não conhecem os pacientes antes da consulta para uma prescrição letal. Além disso, o Estado não inspeciona tudo. Apenas
recebe os documentos emitidos pelo médico depois do fato.
FOLHA - Cada ser humano deve ter
o direito de morrer?
SMITH - Não acredito que haja
o "direito de morrer". Temos,
penso, o direito de recusar um
tratamento médico não desejado, porque forçá-lo seria uma
agressão.
Mas isso não significa direito
de morrer. Também não temos
o direito de ter uma outra pessoa para facilitar nosso suicídio
ou nos matar porque queremos
morrer. A questão então se torna: qual é a reação apropriada
para uma comunidade quando
um dos seus membros está tão
desesperado a ponto de querer
morrer?
FOLHA - Quais são as alternativas?
SMITH - As alternativas são cuidados melhores, mais inclusão,
prevenção do suicídio e amor
do paciente pela família, pelos
amigos e pela sociedade.
De fato, acho estranho que
justo quando realmente podemos impedir pessoas de morrer
em agonia, a eutanásia se torne
mais popular.
Isso é estranho. Acho que há
águas culturais profundas aqui
que podem refletir um niilismo
insalubre.
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