São Paulo, domingo, 15 de outubro de 2006

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Conversas afiadas

Série reúne críticos como Philippe Sollers, Thomas Pavel, Antoine Compagnon e Alain Finkielkraut para debaterem o romance

PATRICK KÉCHICHIAN

Os críticos literários com freqüência estão cansados, desanimados de assumir esse nobre e minúsculo magistério que consiste em avançar na direção de obras e de autores com competência suficiente, sim, mas sobretudo desejo e disponibilidade suficientes.
Em seu programa "Répliques" [Réplicas], na rádio France Culture, Alain Finkielkraut não é um apresentador que se contenta em segurar o microfone: ele faz realmente um trabalho de crítica, com sua própria voz.
Aliás, quase não o vemos agir de outro modo, pois o vigor e a determinação de seu envolvimento parecem ter superado qualquer cansaço e desânimo.

Poderes da literatura
A retomada em grande volume de entrevistas radiofônicas neste "Ce Que Peut la Littérature [O Que Pode a Literatura, Stock/Panama, 300 págs., 18,50, R$ 50] é arriscada, mas ao ler a transcrição (revisada e emendada pelos interessados) desses 12 debates que reuniram em cada uma das vezes, além de Finkielkraut, dois convidados, felizmente predomina a impressão de solidez e de verdadeiro diálogo. Impressão que é reforçada pelo fato de que os convidados defendem e promovem seus próprios livros -o que dá a suas palavras uma liberdade revigorante.
No atual volume, primeiro de uma série, é abordada principalmente a questão do romance e a dos poderes da literatura, que Finkielkraut resume citando Paul Ricoeur: "O que saberíamos do amor e do ódio, dos sentimentos éticos e, em geral, de tudo o que chamamos de "eu" se não tivesse sido transportado à linguagem e articulado pela literatura?".
Mona Ozouf e Pierre Manent, na estréia, sobre Henry James; Suzanne Julliard e Bertrand Visage a propósito de "O Primeiro Homem" [ed. Nova Fronteira], de Camus ("A expressão de uma literatura que não se separa de ninguém", diz com excelência Visage); Claude Habib e Pierre Pachet sobre "Desonra" [Cia. das Letras], de J.M. Coetzee; Geneviève Brisac e Valérie Zenatti a propósito de Aharon Appelfeld; Pierre Pachet novamente e Michel Aucouturier sobre Boris Pasternak; Antoine Compagnon e Eric Marty sobre Roland Barthes e o romance; Thomas Pavel e Marc Fumaroli dividindo o "gosto pelos clássicos"; Jacques Roubaud e Jacques Garelli definem o "lugar dos poetas"... São apenas alguns dos temas não somente abordados, mas realmente desenvolvidos.
Os intercâmbios às vezes podem ser contraditórios e francos, e Alain Finkielkraut toma partido animadamente, como no "caso Aragon", com Daniel Bougnoux e François Taillandier, ou ainda mais sobre Céline, com Philippe Sollers no papel do advogado e Jean-Pierre Martin. Sobre Céline, Finkielkraut lembra a bela e justa frase de Gracq: "Há em Céline um homem que se pôs a marchar atrás de seu clarim".

Disjunção
E esta outra, a propósito de Barthes: "Não é na literatura que se opera (...) a disjunção entre antigos e modernos, mas entre a literatura como santuário de delicadeza e a grossura florescente".


Este texto saiu no "Monde".
Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves.


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