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PONTO DE FUGA
Construções do passado
JORGE COLI
especial para a Folha
Salvo poucas e honrosas exceções, a História de nossa arquitetura tem sido pobre, muito
pobre. É verdade que esse panorama tem melhorado bastante, mas, ainda hoje, em
maioria, seus autores são arquitetos que, se revelam amor
por seu objeto, não o sustentam
com as exigências do historiador. A fraqueza do método, a
insuficiência dos estudos de casos singulares são substituídas
por um ensaísmo propenso a
explicar o particular por meio
de generalizações simplistas.
Pela primeira vez, um livro
avança na História da História
de nossa arquitetura para fazer-lhe a crítica. Com um título
provocador: "Por uma História
Não Moderna da Arquitetura
Brasileira" (Pontes ed.), ele
propõe uma aguda e corajosa
reflexão. Corajosa, porque o
autor, Marcelo Puppi, conduz
seu pensamento até a produção mais atual: ora, os domínios dos arquitetos tendem ao
inatacável e à sacralização, à
suficiência e ao indiscutível.
Puppi escolhe um recorte preciso: o período que, no Rio de Janeiro, precede à geração dos
modernos -isto é, a de Lúcio
Costa ou Niemeyer- e examina o modo como a História,
moderna, o tratou. O núcleo
determinante, que conformará
os pensamentos futuros, são os
escritos de Lúcio Costa. A partir daí, de maneira implacável ,
o autor vai desmontando, um a
um, os preconceitos estéticos, a
falta de fundamentação historiográfica, a fragilidade dos raciocínios, as intuições sumárias que se instalam como leis
axiomáticas. Livro que se lê de
um fôlego, estimulante e iluminador para o pensamento sobre nossas artes.
SEMPRE-VIVA - Anne Rice
escreve sobre a imortalidade
em "The Vampire Armand"
(Knopf), ainda não lançado no
Brasil. Como seus antepassados literários, ela se esmera em
cultivar certas exacerbações e,
no frêmito provocado, a frase
encontra sua razão de ser. Inversões de todo tipo e metáforas se entronizam como perversas por serem vazias, caudalosas fontes do horror com brilhos de "guilty pleasure". A
imortalidade, que está na própria natureza das grandes
obras, das religiões e dos vampiros, figura com proeminência
na trama. Dela provém a vertigem da vida humana aumentada à grandeza do milênio;
para seus protagonistas uma
semana pode ser feita de séculos. São personagens maiores
do que a História, cujo traçado
se subordina a uma curiosa indiferença "new age".
GOLPE - Os prêmios conferidos pelo Ministério da Cultura
a artistas consagrados criam
situações que chegam às raias
do grotesco. Na falta de outro
meio, esse Ministério inerte,
sem uma política efetiva de estímulo à criação, esquecendo
artistas jovens ou mais obscuros, manobra pequenamente
ao distribuir dinheiro para
quem não precisa, tentando,
assim, recuperar um pouco para si o sucesso e o prestígio
alheios.
OLÉ - "Carmen", no Theatro
Municipal de São Paulo. Luis Lima, estupendo D. José; voz soberba
de Carolyn Sebron. Rara força expressiva no último dueto, onde, como um menino perdido, o pequeno
tenor rodeava uma Carmen monumental. Excelentes Coral Lírico
e orquestra, mas Bizet pôde mostrar-se mais difícil do que Mahler
para um Karabtchevsky incapaz
tanto de melancolia elegíaca (o
modo como ele assassinou o prelúdio do terceiro ato), quanto de ritmos pulsantes.
Jorge Coli é historiador da arte.
E-mail: coli20@hotmail.com
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