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Giucci, de outro, o Mais! encerra a polêmica em torno do livro "Gilberto Freyre - Uma Biografia Cultural"
Identidade e cultura
ENRIQUE RODRÍGUEZ LARRETA
GUILLERMO GIUCCI
ESPECIAL PARA A FOLHA
Não faz sentido discutir aspas, citações e referências
até a eternidade.
Escrevemos a biografia partindo de um interesse pela importância contemporânea de Gilberto Freyre. Investigamos a genealogia
da mestiçagem interrogada pelas políticas de identidade, os
processos de transculturação,
assim como a experiência vital
de um intelectual e suas idéias.
Inicialmente nos inspiramos
no esforço biográfico de Curt
Paul Janz, em sua monumental
biografia de Nietzsche, baseada
na reconstrução de contextos,
de leituras e escritos do autor
alemão, diminuindo os inevitáveis anacronismos e projeções
ideológicas.
No caso de Freyre, propusemos mostrar como pensamento e vida se combinam em uma
construção de identidade, nas
condições de um jovem provinciano situado entre muitas tradições, um pouco como ocorreu com o jovem V.S. Naipaul, quando chegou a uma Londres
idealizada desde a longínqua
Trinidad, devido à sua educação colonial.
Nossa interpretação considera os processos de mistura
cultural e visão ex-cêntrica,
examinando o modo como as
idéias metropolitanas são reinterpretadas a partir de outros
locais de enunciação.
Diálogo com o moderno
Situamos a experiência intelectual de Freyre em diálogo
singular com o pensamento
moderno.
Apresentamos-lhe como um
"retroprogressista", para empregar a expressão de Salvador
Pániker, como um escritor que
imagina uma civilização triunfante nos trópicos, inclusive
uma possível modernidade alternativa e plural capaz de enfrentar o modelo da via de mão
única da cinzenta "civilização
carbonífera", como escreve Gilberto Freyre.
Estudamos Freyre como um
autor imerso nas conquistas
das ciências sociais de vanguarda da época, sendo receptivo às
mesmas, em uma demonstração de "humanismo inclusivo",
no sentido usado por José Guilherme Merquior.
Algo além de um ensaísta regionalista, vitoriano ou hispânico, com uma clara tendência
a superar uma visão organicista
da cultura por uma mais porosa, em que a intersubjetividade
ocupa lugar de destaque.
Mostramos a importância do
"momento" sociológico entre
"Casa-Grande e Senzala" e "Sobrados e Mucambos" e como os
conceitos-chave foram usados
para dar luz a esse esplêndido
trabalho de antropologia histórica de uma civilização híbrida
que é "Sobrados e Mucambos".
Livro fluido
Freyre nos interessa em relação às urgências do nosso tempo. A ascensão do racismo e da
xenofobia, as reinvenções nacionais em curso na América
Latina e outras partes do mundo. Escrevemos um livro fluido,
nos atendo às regras narrativas
do gênero biográfico e recorrendo a uma prosa que fizesse
jus a Gilberto Freyre.
Seriedade e enfado não são
sinônimos, embora alguns historiadores pensem o contrário.
Valorizamos o diálogo e a crítica, mas rechaçamos, veementemente, o autoritarismo da resenha publicada no Mais! de 2/12. Esse é um estilo que estamos inclinados a chamar de
"vitoriano" em um dos sentidos do termo: uma atitude ao
mesmo tempo moralizante e
imperial.
A leitura da biografia cultural é a forma mais prática para
que os leitores interessados no
tema decidam por si mesmos.
Assim será possível compará-la
a outros livros sobre Gilberto
Freyre, por sua qualidade literária, apresentação de documentação relevante e inteligência interpretativa e, desse
modo, extrair suas próprias
conclusões.
ENRIQUE RODRÍGUEZ LARRETA é antropólogo
e diretor do Instituto do Pluralismo Cultural da
Universidade Candido Mendes (RJ).
GUILLERMO GIUCCI leciona na pós-graduação
em letras da Universidade do Estado do RJ.
NA INTERNET - Leia texto dos autores, publicado no Mais! de 9/12, em
www.folha.com.br/073462
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