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A invenção jurídica do autor
Roger-Pol Droit
do "Le Monde"
É meu livro", diz o autor com orgulho. "É meu livro", diz também
o comprador do volume. Ambos
têm razão, é mesmo "seu livro",
mas, evidentemente, em sentidos diferentes. Um concebeu a obra, o outro
possui um exemplar dela. Isso parece
muito simples à primeira vista.
Mas, assim que começamos a entrar
no detalhe, tudo se complica. O que o
autor possui exatamente? Em que sentido? Em razão de que direito? De que,
por sua vez, o cliente do livreiro se torna
proprietário? A essas perguntas, inspiradas em Kant, assim como o exemplo
inicial, outras se acrescentam se incluirmos o editor, os herdeiros, as adaptações... Nesse labirinto de dificuldades,
Bernard Edelman constitui um guia excepcional. Poderíamos pensar que é
normal: esse advogado é especialista em
direito autoral e propriedade intelectual. Mas estaríamos enganados.
Pois é como genealogista, arqueólogo
e historiador que explora, em "Le Sacre
de l'Auteur" [A Sagração do Autor, ed.
Seuil, 380 págs., 22 euros] não a jurisprudência dos casos contemporâneos,
mas a implementação jurídica e literária, ao longo dos séculos, da "função autor". Tornou-se habitual pensar que um
indivíduo pode criar soberanamente
uma obra do espírito, mas nada é menos histórico que tal conclusão.
O grande mérito do livro de Edelman
é o de explicar o longo processo jurídico
pelo qual se chegou lá. A Antigüidade
não conhecia nenhum equivalente desse autor soberano. Os plagiadores existiam, claro. Mas bastava, como fez Cícero, tentar envergonhá-los ao desmascarar sua trapaça. A idéia de processá-los
na Justiça não poderia se constituir, à
falta de leis adequadas e à falta, sobretudo, da idéia de um texto intangível que
emana de um indivíduo-autor.
A obra literária permanece uma realidade instável ao longo da Idade Média.
Todo mundo pode legitimamente remodelar um texto, versificar o que é
prosa ou o contrário. É preciso que nasça a "república das letras", a constituição dos livreiros, o estabelecimento de
privilégios para que novas questões comecem a ser colocadas. Então se desenha lentamente o rosto do autor.
Edelman insiste em uma virada, a de
1637-38, em que evidentemente se reconhece a querela da peça "El Cid". "Não
devo senão a mim mesmo todo o meu
renome", proclama Corneille em "L'Excuse à Ariste", inaugurando a autocriação do autor, anunciando a ascensão do
individualismo e o sagrado futuro de
um eu todo-poderoso.
No entanto nenhuma conseqüência
jurídica se seguiu. É preciso que terminem de triunfar o indivíduo, os direitos
do homem e a Revolução Francesa para
que se estabeleça a paisagem que conhecemos. Definitivamente? Nada é
muito seguro. Edelman não aposta na
morte do autor. Mas o que diz sobre as
invenções digitais mostra que o risco
existe. O próximo século verá talvez esse
autor, de soberania afinal juridicamente
estabelecida, morrer sem glória, "assassinado sob o peso da tecnologia e do
mercado".
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.
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