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Obra capital de Proust sai em árabe
Tradução de "Em Busca do Tempo Perdido" durou 29 anos e envolveu 3 países
GAMAL GHITANY
Tendo sempre temido a idéia
de ter que deixar este mundo
antes de ter podido ler "Em
Busca do Tempo Perdido" inteiro, me sinto tranqüilizado, agora
que o texto finalmente está disponível em árabe. Foram necessários ao
todo 29 anos e os esforços conjugados de três países para levar esse empreendimento a cabo.
O romance de Marcel Proust
(1871-1922) foi mencionado pela primeira vez no Egito em 1945, pela revista "L'Écrivain Égyptien" ("Al Katib al Masri"), fundada pelo arcano
das letras que foi Taha Hussein. Nos
anos seguintes, os intelectuais egípcios e árabes que não liam o francês
puderam familiarizar-se com o romance, mesmo assim por meio de
artigos e obras de crítica literária publicados em árabe.
A história da tradução de "Em
Busca do Tempo Perdido" começou
em 1977, com o lançamento na Síria
de "O Caminho de Swann". Essa primeira parte do romance foi traduzida por Elias Badiwi, um tradutor
emérito que conseguira conquistar o
apoio da ministra da Cultura síria da
época, Najah al Attar. Seguiram-se
"À Sombra das Raparigas em Flor",
em 1979, e, em 1980, "O Caminho de
Guermantes".
Interrupção prolongada
Em seguida, o projeto foi interrompido por longo tempo, devido à
falta de recursos. Vendo que a publicação das duas partes restantes estava demorando a acontecer, o Centro
Nacional do Livro (CNL) francês,
por meio do programa de apoio à
edição (batizado de Taha Hussein)
que mantém através da embaixada
francesa no Cairo, decidiu retomar a
seu cargo a publicação de uma edição egípcia integral. Para isso, as três
partes que já tinham sido publicadas
ganharam uma reedição, lançada
em Damasco, em 1994.
Decidiu-se que a parte seguinte da
tradução sairia no Egito, seguindo o
ritmo do trabalho de Elias Badiwi.
Infelizmente, embora o trabalho que
ele concluiu tenha sido editado no
Cairo ("Sodoma e Gomorra", em
1998, e "A Prisioneira", em 2001), a
publicação, para o tradutor, foi póstuma: ele morreu em 1997.
Foi um erudito sírio especializado
em literatura francesa, o professor
Jamal Cheyahed, quem tomou a seu
cargo a seqüência do trabalho, responsabilizando-se pela tradução dos
volumes restantes, "Albertine Desaparecida", em 2003, e "O Tempo Redescoberto", alguns meses atrás.
Assim, a íntegra de "Em Busca do
Tempo Perdido" já está disponível
em árabe. Trata-se de um acontecimento importante que o "Les Nouvelles Littéraires" ("Akhbar al
Adab"), o único periódico literário
do mundo árabe, comemorou com
um número especial dedicado a
Proust e a sua influência na literatura árabe. Excetuando os amantes da
França, especialmente os professores de literatura francesa, conheço
apenas um intelectual egípcio que,
antes disso, tenha lido "Em Busca do
Tempo Perdido" na íntegra: Naguib
Mahfouz, que o leu muito cedo
-em inglês.
A história é bastante engraçada:
em 1948, confrontado com a decisão
inopinada de transferi-lo do cargo
que ocupava num gabinete ministerial, Mahfouz se viu encarregado da
conservação de um prédio da parte
antiga do Cairo, que datava do século 16: o domo do sultão Ghouri.
Enquanto se perguntava como iria
passar o tempo, qual não foi sua surpresa ao encontrar, nos recônditos
do edifício, uma biblioteca rica da
qual fazia parte justamente essa versão inglesa de "Em Busca do Tempo
Perdido". Mahfouz mergulhou imediatamente na leitura, saboreando-a
como se fosse uma coletânea de poemas, lendo certo número de páginas
por dia. De acordo com ele, foi uma
leitura inesquecível e que lhe deixaria marcas profundas.
Proust no Brasil
"Em Busca do Tempo Perdido":
R$ 149,00 (a caixa), tradução de Fernando
Py, Ediouro (tel. 0/xx/21/ 3882-8200); ou em
sete volumes (de R$ 20,50 a R$ 35,00 o volume), vários tradutores, ed. Globo (tel. 0/xx/
11/ 3362-2000).
Este texto foi publicado no "Le Monde".
Tradução de Clara Allain.
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