São Paulo, domingo, 19 de novembro de 2000

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A favorita de Toulouse-Lautrec

Betty Milan
especial para a Folha

N ascida em Buenos Aires e radicada em Paris, Alicia Dujovne Ortiz é uma das figuras modernas mais interessantes da cena cultural francesa. Na Argentina, foi jornalista e escreveu três livros de poesia. Em 1978, estabeleceu-se na França e aí publicou vários romances. Com a biografia de Eva Perón, lançada em 1995, teve grande sucesso. Depois, publicou "Mulher Cor de Tango", que está sendo lançado agora no Brasil.

Como chegou à personagem do livro?
Em 1994 eu estava em Albi, no sudoeste da França, escrevendo a biografia de Eva Peron e visitei o museu Toulouse-Lautrec, onde há um quadro, "No Salão da Rua dos Moinhos", de que eu gosto muito. É uma cena de bordel. No primeiro plano, estendida num divã de veludo carmesim, uma ruiva de camisola transparente e meias verdes. Depois, um dia, um amigo me trouxe um texto de Cortázar, "Um Tango para Lautrec". Fiquei sabendo que a minha ruiva das meias verdes se chamava Mireille, que tinha sido uma das favoritas de Toulouse-Lautrec e tinha decidido seguir o caminho de Buenos Aires, o da prostituição francesa na Argentina no começo do século 20. Achei extraordinário a moça que tanto me atraía ter acabado a vida num bordel da minha cidade.
O texto de Cortázar foi um achado?
Retomei o texto dele e disse a mim mesma que Mireille talvez tivesse se tornado Mireya num bordel de francesas, o Regine, que ficava em Buenos Aires, que talvez tivesse descoberto o tango e dançado como ninguém e que reencontrara uma tintureira de Toulouse, uma sua compatriota, que teve uma criança que um dia seria Carlos Gardel, de quem ela foi a primeira amante. No seu romance o tango é quase uma personagem... Sim, na medida em que se trata de um romance de imigração. Para Mireya a dança oblíqua do tango tem a inclinação da ponte do navio de imigrantes, que os argentinos guardaram para sempre no fundo da sua memória. É por isso que o tango não se dança em linha reta, e sim de viés, e os pés não batem na terra, acariciam-na apenas, como se a terra se movesse. Trata-se ainda e sempre de uma dança que ocorre numa terra estrangeira.
O que produz atualmente?
Escrevo sobre Dora Maar, a amante de Picasso. Nunca consegui me interessar por personagens que imaginam ter uma identidade única e viver num país que acreditam ser o deles.

A Mulher da Cor do Tango
256 págs., R$ 27,00
de Alicia Dujovne Ortiz. Tradução de Enrique Boero Baby. Ed. Record (r. Argentina, 171, CEP 20921-380, RJ, tel. 0/xx/ 21/ 585-2047).


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