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"Atrapalhou minha vida, acabou com a dele", diz vítima
DA SUCURSAL DO RIO
Quase quatro décadas depois dos
eletrochoques
acionados com
manivela e do espancamento que ele denunciou ter sofrido e sentença judicial reconheceu, Raphael
Viviani, 68, esboça em mão
dupla seu balanço sincero da
história: "Isso aí atrapalhou
deveras a minha vida, passei
um sufoco muito grande. E
ele também acabou com a vida dele".
"Ele" é Wilson Simonal, o
ex-patrão cuja firma foi alvo
de uma reclamação trabalhista do seu antigo chefe de escritório -e não contador, como até hoje se repete- contratado em outubro de 1970 e
demitido em junho seguinte.
Em 24 de agosto de 1971,
por volta das 23h50, um
agente e um colaborador do
Dops apanharam-no em casa.
Era o dia seguinte à notificação da queixa pela Junta de
Conciliação.
Já na companhia de Simonal, levaram-no para a repartição policial -de onde ele
sairia por volta das 20h do dia
25, após redigir de próprio
punho uma confissão de
apropriação indébita.
Obrigaram-no -foi isso
que a Justiça concluiu - a escrever que gastou o dinheiro
em "noitadas, bebidas e mulheres". No processo, não
consta prova ou indício documental de desvio.
"Como é que eu vou esquecer uma coisa dessa?", pergunta, sobre os idos de 1971.
"Não tem jeito de esquecer
aqueles dias tumultuados. Se
você me visse antes e depois
daquela noite que eu passei
sendo torturado lá, não diria
que é a mesma pessoa."
"Uma foto antes e uma depois, elas saíram num jornal
vagabundo, que inverteu toda
a minha história, você não diz
que é a mesma pessoa. É uma
coisa que eu não vou esquecer. Vou acabar levando para
o túmulo."
Viviani conversou com a
Folha por telefone -foi fácil
encontrá-lo recorrendo à lista, pelo nome de um parente
que mora com ele em um
bairro da zona oeste de São
Paulo.
O escriturário conta estar
aposentado por invalidez
permanente -um diabetes
que teria começado a se manifestar em seguida à sua detenção.
Ele reapareceu publicamente com um depoimento
no filme "Simonal - Ninguém
Sabe o Duro Que Dei".
Como ainda recordava o
tom antipático contra ele em
segmentos consideráveis do
jornalismo, nos dias e semanas posteriores à sua passagem pelo Dops, falou ao documentário "para desabafar um
pouco".
"Estava todo mundo formando ideia contra mim. Vou
esclarecer isso aí, não devo
nada, seria bom. Minha família não gostou que eu tenha
feito isso. E até hoje eles não
querem que eu mexa mais
com isso. E eu não tenho muito o que falar."
(MM)
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