São Paulo, Domingo, 21 de Novembro de 1999
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A investigação em suspenso

da Reportagem Local

Entre os mistérios que ainda envolvem o Riocentro, é presumível que a bomba tenha sido entregue já no local a Rosário e a Wilson. Este sempre reiterou que dera ao sargento carona num posto de gasolina da estrada que liga Grajaú a Jacarepaguá. É pouco provável que tenham transportado os explosivos num automóvel pequeno e vulnerável aos solavancos de um caminho esburacado.
O mistério é ainda maior quanto se trata da carta-bomba da OAB. Sete semanas depois do atentado foi preso Ronald James Watters, então com 51 anos. Civil, ex-agente de informações da Marinha, tornou-se o principal suspeito em inquérito que passou aos poucos das mãos da Polícia Federal para as do SNI. Ele foi julgado e absolvido, por falta de provas, em fevereiro de 1982.
Seu principal álibi: sua aparência física não coincide com aquela que a faxineira Dilza Fulgêncio Pereira forneceu do entregador da carta-bomba. Seria a de um homem de 25 anos, cabelos compridos e barba rala, com os olhos ligeiramente puxados. Quando presidente nacional da OAB, em 1981, o sucessor de Seabra Fagundes (a quem o explosivo estava teoricamente endereçado) e hoje senador Bernardo Cabral (PFL-AM) considerou que Watters não passava de "bode expiatório".
Uma das pistas contra ele estava na máquina de escrever com uma falha de impressão no lado esquerdo da letra "v", utilizada para redigir comunicado sobre o atentado remetido ao "Jornal do Brasil". Watters foi "reconhecido" como proprietário da máquina pelo dono de uma oficina de reparos do bairro de Botafogo. Mas um agente da DPF com quem a Folha conversou há dias insinuou ter havido prova forjada. A máquina identificada pela perícia não era a Remington que Watters supostamente mandou consertar. Além do mais, semanas depois a verdadeira máquina com o defeito no "v" foi localizada num ferro-velho carioca, detalhe considerado depois irrelevante.
No processo em que foi absolvido, Watters teve um advogado de defesa de Porto Alegre custeado pelo então deputado Magalhães Pinto (PDS-MG), já morto, ex-governador de Minas e ex-ministro das Relações Exteriores durante o regime militar. Não se sabe se por conta de Watters, ou se a prisão dele já fazia parte do jogo, mas os responsáveis pela investigação tentaram envolver Magalhães. Banqueiro, ele acreditava ser uma opção, liberal e civil, para a sucessão de Figueiredo. Watters diz tê-lo conhecido em 1962. O telefone do deputado foi encontrado em sua agenda quando ele foi preso e mantido incomunicável.
Uma escrivã da Polícia Federal, fazendo-se passar por mulher de Watters, telefonou ao gabinete de Magalhães e pediu dinheiro para que "o marido", em dificuldades, "pudesse deixar o país". A entrega de dinheiro chegou a ocorrer -diante da agência do Banco Nacional da avenida Rio Branco, no Rio. Mas era uma quantia insuficiente para que, numa operação de fuga, Watters tomasse um ônibus até a fronteira do Paraguai.
Outro detalhe curioso está no explosivo utilizado para a carta-bomba, a nitropenta, mesma matéria-prima usada em outra bomba colocada no Rio naquele mesmo 27 de agosto. Foi na Câmara Municipal e sobre a qual o general Waldyr Muniz, conforme entrevista recente à Folha de um outro oficial de informações, o coronel José Ribamar Zamith, teria tido prévio conhecimento. Houve ainda a bomba na sede da Sunab, que não chegou a explodir.
A Polícia Federal não investigou os outros explosivos. É possível que no percurso encontrasse mais uma vez o marceneiro Hilário Corrales, que confessou a seu irmão ter sido um dos dos envolvidos na carta-bomba da OAB. (JBN)


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