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Filmoteca básica
Amarcord
ANTONIO ARNONI PRADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Impossível não lembrar de "Amarcord". Pelo
que sugere na reconstituição de cada instante da vida,
das nossas circunstâncias, do retrato do passado de cada um, de uma época, de toda uma cidade. Fellini põe
diante da gente, num simples enquadramento de uma
tarde, o que talvez Proust tenha passado a vida reconstituindo. Como num ciclo que dura uma primavera, vemos passar à nossa frente o tempo da infância e da velhice. Os amigos que se foram, as namoradas que quisemos
e não tivemos, as ilusões da escola, a galeria dos mestres
que nos marcaram para a vida toda, a consideração pelos
párias, que não deixaram de ser párias. E ficamos para
sempre encantados pelas músicas de Nino Rota [1911-79], que reacende em nossas vidas um desejo impossível
de começar tudo de novo ou de reencontrar um sentido
para nossas vidas.
É uma grande lição que só a arte nos pode dar. Renascemos com Fellini a cada ilusão que perdemos. Revivemos
com ele um universo de seres e lembranças que nasceram
com a gente e sempre nos acompanharam. Depois dele, a
recordação deixou de ser um mero capricho. "Amarcord" reencontra o tempo perdido e nos mostra que só
nele a vida pode ser vivida em sua plenitude. Não importa se para rir ou para chorar.
Antonio Arnoni Prado é professor de teoria literária da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp).
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