São Paulo, domingo, 22 de janeiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Filmoteca básica

Amarcord

ANTONIO ARNONI PRADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Impossível não lembrar de "Amarcord". Pelo que sugere na reconstituição de cada instante da vida, das nossas circunstâncias, do retrato do passado de cada um, de uma época, de toda uma cidade. Fellini põe diante da gente, num simples enquadramento de uma tarde, o que talvez Proust tenha passado a vida reconstituindo. Como num ciclo que dura uma primavera, vemos passar à nossa frente o tempo da infância e da velhice. Os amigos que se foram, as namoradas que quisemos e não tivemos, as ilusões da escola, a galeria dos mestres que nos marcaram para a vida toda, a consideração pelos párias, que não deixaram de ser párias. E ficamos para sempre encantados pelas músicas de Nino Rota [1911-79], que reacende em nossas vidas um desejo impossível de começar tudo de novo ou de reencontrar um sentido para nossas vidas.
É uma grande lição que só a arte nos pode dar. Renascemos com Fellini a cada ilusão que perdemos. Revivemos com ele um universo de seres e lembranças que nasceram com a gente e sempre nos acompanharam. Depois dele, a recordação deixou de ser um mero capricho. "Amarcord" reencontra o tempo perdido e nos mostra que só nele a vida pode ser vivida em sua plenitude. Não importa se para rir ou para chorar.


Antonio Arnoni Prado é professor de teoria literária da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).


Texto Anterior: Cultura: Os corpos descarnados das passarelas
Próximo Texto: + política: O Estado contra a nação
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.