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E se o Brasil fosse uma monarquia?
Para Fábio Wanderley Reis, pouco mudaria: o Poder Moderador seria mais um atrativo para a corrupção
DA REDAÇÃO
Se o Brasil tivesse continuado a ser uma
monarquia até hoje,
pouca coisa seria diferente: o Poder Moderador representaria custos a
mais para o país, encenaria um
papel apenas simbólico para a
sociedade e haveria mais uma
frente para a corrupção, na opinião do cientista político Fábio
Wanderley Reis.
Para ele, mesmo se não houvesse a instauração da República, em 1889, a monarquia não
duraria muito mais: "A monarquia era candidata perene a ser
vítima das turbulências sociais
e econômicas".
O professor emérito da Universidade Federal de Minas
Gerais brinca com aqueles que
acenam com o Reino Unido como exemplo de que a monarquia pode criar uma boa democracia: "Se me dessem a Inglaterra, eu não precisaria de monarquia nem de rei para fazer
uma democracia".
(ERNANE GUIMARÃES NETO)
FOLHA - Como seria o Brasil se tivesse permanecido monárquico?
FÁBIO WANDERLEY REIS - Não acredito que haveria grande diferença. Certamente os fatores
que fazem a dinâmica econômica e social da vida brasileira
não seriam afetados de modo
importante. O que aconteceu
na Proclamação da República, a
monarquia pagando as conseqüências do fim da escravidão,
provavelmente ocorreria em
outras circunstâncias.
Quando houve [em 1993] o
plebiscito para escolher monarquia, de um lado, e de outro
a disputa entre presidencialismo e parlamentarismo, havia
gente defendendo a sério a monarquia, apontando o caso britânico como exemplo de democracia. Eu respondia: "Se me
dessem a Inglaterra, não precisaria de monarquia nem de rei
para fazer uma democracia".
Com o legado complicado
que temos, em particular o escravista, dificilmente teríamos
um fator benigno na manutenção da monarquia.
FOLHA - Há quem a defenda argumentando que a nobreza não tem
interesse em corrupção. Ficaram
exemplos disso?
REIS - Não acredito que a nobreza não seja corrupta por definição. Ser nobreza é garantia
de uma condição socioeconômica, mas isso não a isenta.
Eles não são feitos de outra
massa, o sangue não é realmente azul. É uma questão de oportunidade.
FOLHA - E houve aqueles que, não
sendo da nobreza, tentaram chegar
a ela pelos meios mais variados...
REIS - Nesse sentido, seria um
estímulo à corrupção.
FOLHA - E a relação entre massa e
elite? Na monarquia, a elite já é privilegiada e não precisa competir
com as massas, portanto o capitalismo funciona diferentemente, não?
REIS - Esse pressuposto só é válido se, além de monárquico, o
regime for absolutista. Com o
regime constitucional, democrático, há competição entre
elites. Tem-se a figura do monarca exercendo um papel simbólico, enquanto a liderança
efetiva está no Parlamento.
Portanto, há competição.
É interessante que as elites
sejam porosas, no sentido da
mobilidade social, de um país
dinâmico com uma elite autêntica -não simplesmente um
traço socioeconômico, no sentido em que se usa a palavra hoje. Não há razão para imaginar
que teríamos uma sociedade
mais parecida com esse modelo
por causa da monarquia.
FOLHA - O que seria diferente?
REIS - Teríamos um aparato estatal envolvendo a monarquia.
A família real seria mantida pelo erário público, com alguma
função simbólica. Mas a suposição de que duraria até hoje é
precária; a monarquia era candidata perene a ser vítima das
turbulências sociais e econômicas do período e posteriores.
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