São Paulo, domingo, 26 de maio de 2002

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Leandro Konder

O estádio está em silêncio.
Petkovic vai cobrar o escanteio.
Na área, diante do gol, atacantes e defensores se acotovelam, ansiosos. Todos têm a esperança de que a bola passe ao alcance de seus respectivos pés e cabeças. O goleirão está atento para a possibilidade de segurá-la antes do ataque inimigo.
Pet calcula. Em vez de tentar lançar a bola na área, para a aleatória cabeçada de algum companheiro, ele calcula o que precisaria fazer para marcar um gol olímpico. Calcula a força do impacto da sua chuteira na bola, para que ela não caia antes do primeiro ou depois do segundo pau. Calcula a direção, para evitar que a bola caia fora do campo e para impedir que ela se desvie do grupo dos que se acotovelam e se distancie da zona do agrião, indo na direção tranquilizadora do centro do gramado.
O cálculo mais difícil é o do movimento rotativo que o chute deve imprimir à bola. Só se for chutada com efeito é que a bola poderá percorrer uma linha ligeiramente curva e entrar no gol pela pequena porta que o guardião não conseguiu fechar.
A torcida do Flamengo -tão sofrida!- espera o gol, pressente a intenção de Pet e se prepara para o grito.
No momento do chute, todos os cálculos são postos de lado. Todo o poder é entregue ao pé e à sua sabedoria peculiar.
A bola entra.


Leandro Konder é professor de filosofia na Pontifícia Universidade Católica (RJ), autor de "O Futuro da Filosofia da Práxis" (ed. Paz e Terra) e "A Morte de Rimbaud" (Cia. das Letras), entre outros.


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