São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2007

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+ saúde

Aumentando a dosagem

Livro traça a história da medicina oriental, sua fusão com a do Ocidente e as perspectivas futuras

JAMES WILSDON

Nas raras ocasiões em que se cansa de atacar a religião, o biólogo Richard Dawkins aproveita para se divertir fazendo críticas à medicina alternativa.
Em agosto, apresentou um documentário na TV britânica no qual criticava o "Serviço Irracional de Saúde" como "uma indústria multibilionária que empobrece nossa cultura e nos força a aceitar gurus da nova era que nos exortam a escapar da realidade".
Dois meses antes, o farmacologista David Colquhoun apelara às universidades para que deixassem de conceder diplomas em medicina alternativa, afirmando que "baboseiras estão sendo ensinadas como se fossem ciência em algumas universidades britânicas".
O traço comum entre essas críticas é a suposição de que o iluminismo deu origem a uma era dourada da medicina ortodoxa, baseada em pesquisa científica rigorosa e objetiva sobre o mundo, que estaria agora sendo solapada pelo que Dawkins define como "uma epidemia de pensamento supersticioso".
Mas as fronteiras entre a medicina ortodoxa e a alternativa jamais foram estáveis, como nos lembra Roberta Bivins em "Alternative Medicine? A History" [Medicina Alternativa?
Uma História, Oxford University Press, 238 págs., 14,99, R$ 55], seu elegante e envolvente livro sobre o tema.
A medicina alternativa não é novidade, e o modo como as tradições da China, Índia e de outros lugares influenciaram a medicina européia pode ser traçada ao longo da história.
Até o século 18, por exemplo, havia muitas semelhanças entre esses sistemas médicos diferentes, na modo como refletiam sobre o corpo humano e sua relação com o universo.
Essa herança comum terminou por ser erradicada da história da medicina ocidental. Com o tempo, as noções de ortodoxia se enrijeceram. Porque a biomedicina convencional agora se apresenta como detentora de conhecimento absoluto, os praticantes de abordagens diferenciadas se vêem forçados a se apresentar como "complementares" ou "alternativos".
Bivins nos conduz em uma fascinante jornada do Oriente ao Ocidente e de volta, traçando os percursos do conhecimento e da tradição que deram forma à medicina tal qual é hoje praticada. Ela usa como exemplo o medicamento conhecido como Tiger Balm, um bálsamo vendido em embalagens hexagonais de cores brilhantes em mais de cem países.
Embora o Tiger Balm seja produzido em Cingapura, seu maior mercado são os EUA, e a internet agora torna mais fácil do que nunca, aos consumidores ocidentais, obter medicamentos não-convencionais em diversas regiões do mundo.
Da mesma forma que a medicina ocidental sofre influência de outras culturas, os sistemas médicos da China e da Índia estão evoluindo. Bivins enfatiza que "em momento nenhum os sistemas médicos autóctones se mantiveram estáticos diante da biomedicina".
Isso sugere que um novo capítulo pode estar se abrindo para a medicina alternativa, no qual as economias em crescimento combinarão seu conhecimento para criar novos híbridos. O professor Dawkins talvez não goste da idéia, mas ao que parece a medicina alternativa está aqui para ficar.


Este texto foi publicado no "Financial Times".
Tradução de Paulo Migliacci.

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