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Ponto de Fuga
Velhos medos
Em "Atividade Paranormal", a força provém da maneira desprevenida com que tudo é filmado pelos personagens, sem a exploração expressionista de "A Bruxa de Blair'
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JORGE COLI
COLUNISTA DA FOLHA
A volta de "A Bruxa de
Blair" dez anos depois.
É assim que "Atividade
Paranormal", primeiro filme
de Oren Peli, tem sido tratado
nas críticas e comentários.
O paralelo não é falso: baixo
orçamento, tom de cinema "vérité", tema sobrenatural e aterrador, êxito enorme.
Antes de "A Bruxa de Blair",
poucos filmes tentaram, esporádicos, um jogo parecido; salvo erro, apenas três, e admiráveis: "Os Mil Olhos do Doutor
Mabuse", de Fritz Lang, "A
Tortura do Medo", de Michael
Powell (ambos de 1960) e
"Cannibal Holocaust", de Ruggero Deodato (1980).
As coisas mudaram, porém,
nesta década. Câmeras de vídeo, primeiro em fita, depois
digitais, oferecem liberdade e
banalização que, naqueles velhos tempos, eram impensáveis. Ficaram menores e cômodas, com recursos complexos e
captação mais fina, mesmo no
escuro.
Filmagens domésticas acostumaram os olhos com um não
estilo que terminou por virar
um, cheio de solavancos e acidentes. Os reality shows propagaram o voyeurismo. O YouTube demonstrou que o sucesso
brota de bobagens inesperadas,
divertidas, e não de sapientes
imagens elaboradas.
Novas lentes
Em "Atividade Paranormal",
a força provém da maneira desprevenida com que tudo é filmado pelos próprios personagens. Nada de explorações expressionistas, como em "A Bruxa de Blair".
Ao contrário, os momentos
tensos se acentuam quando a
câmera é abandonada a si mesma e registra, incansável, imóvel, a partir de um tripé.
O tempo é controlado pelo
marcador, à direita da tela, que
acelera ou se acalma. Sons, situados fora do que é visível,
acrescentam à verossimilhança
sobrenatural.
O diretor sabe que nenhum
fantasma é mais aterrador do
que o imaginário. Assinala a
presença sobrenatural por indícios apenas. Tudo se passa
numa casa suburbana da Califórnia, moderna, bem iluminada, e não tem qualquer pingo de
gótico.
Os atores que encarnam o casal Katie e Micah são jovens,
desconhecidos, simpáticos e
sem particular glamour: correspondem à verdade do cenário e dos personagens.
Progressão paulatina do sobrenatural, minimalista por vezes: basta uma porta que se movimenta um pouquinho. Nenhuma cena é centrada na histeria. Ao contrário, Katie, sonambúlica, às vezes é tomada
por imobilismo inquietante.
Passado
Na casa americana, num
mundo que é o da banalidade
contemporânea, "Atividade Paranormal" retoma inquietações antigas.
Assim, o privilégio que as câmeras possuem de registrar o
sobrenatural ocorreu muito cedo, com a fotografia, no século
19, captando ectoplasmas em
sessões espíritas.
Desde a invenção dos gravadores de fita que muita gente
partiu à caça de sons vindos do
além. O tema das casas assombradas é velho como o romantismo, assim como o das mulheres possuídas por demônios
ou espíritos.
A estrutura e o andamento da
história são bem parecidos com
os do conto "O Horla", obra-prima que Guy de Maupassant
editou em 1886: nele, o fantasma vampiro vinha de São Paulo, no Brasil. O conto de Maupassant marcou a literatura de
Lovecraft, gênio do terror indizível e invisível. "Atividade Paranormal" pertence a essa
grande linhagem.
Rabicó
Durante dois anos, o filme de
Oren Peli circulou em festivais
e universidades americanas,
antes de ser descoberto por distribuidores espertos.
Ao ser enviado para as grandes salas, o final mudou para
um desfecho mais explícito e
bombástico, ao que parece, por
sugestão de [Steven] Spielberg.
A primeira versão, com um longo e desesperante passar do
tempo, é muito melhor.
jorgecoli@uol.com.br
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