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Brechas legais protegem bilhões nos EUA

Colecionadores de arte como o herdeiro Ronald Lauder, que tem patrimônio de US$ 3 bi, pagam pouco imposto

Reforma do código tributário será um dos principais assuntos da campanha presidencial nos EUA em 2012

DAVID KOCIENIEWSKI
DO “NEW YORK TIMES”

No saguão de mármore de uma imponente mansão da 5ª Avenida, em Nova York, Ronald Lauder era mais que um anfitrião cortês ao receber convidados no final do mês passado.

Para celebrar o décimo aniversário da Neue Galerie, o museu de arte austríaca e alemã criado por Lauder, ele expôs muitos dos tesouros de sua coleção pessoal, avaliada em mais de US$ 1 bilhão.

A coleção inclui peças de Van Gogh, Cézanne e Matisse, além de um Klimt que Lauder adquiriu há cinco anos por US$ 135 milhões.

Mas, para Lauder, um dos herdeiros da fortuna de Estée Lauder e detentor de um patrimônio líquido avaliado em US$ 3,1 bilhões, o significado daquela noitada ia além da cultura e da vida social.

Como costuma ser o caso com muitas de suas atividades, a exposição envolvia um uso astuto do código tributário dos Estados Unidos.

Ao doar suas obras de arte para uma fundação privada, Lauder ganhou o direito a deduções de dezenas de milhões de dólares em seu imposto de renda federal ao longo dos anos.

As doações para caridade feitas por Lauder -que ajudaram causas tão díspares quanto hospitais e projetos de reconstrução da identidade judaica na Europa Oriental- são apenas uma faceta de uma estratégia tributária sofisticada.

Lauder vem há décadas explorando agressivamente os benefícios fiscais que só são acessíveis aos mais ricos.

O debate quanto à redução das proteções e benefícios tributários direcionados aos norte-americanos mais ricos é um dos mais acalorados em Washington.

Esse debate será parte da campanha presidencial depois do fracasso de tentativas de acordo sobre cortes de gastos e reforma do código tributário, no Congresso.

BILIONÁRIOS

Alguns bilionários, entre os quais Warren Buffett e Bill Gates, aderiram aos democratas no apelo pela eliminação dessas vantagens.

Eles dizem que o sistema atual aumenta o deficit orçamentário, contribui para o aumento na disparidade de renda e transfere o peso dos impostos às pequenas empresas e à classe média.

Os republicanos resistem à ideia, afirmando que elevar os impostos pagos pelos ricos prejudicaria a economia e eliminaria empregos.

Um exame de documentos públicos sobre as empresas, investimentos e organizações de caridade de Lauder oferece um vislumbre da ampla gama de opções legais para que os mais ricos cidadãos evitem pagar impostos.

A carga tributária da elite econômica dos Estados Unidos vem caindo nas últimas décadas, de acordo com dados divulgados pelo IRS, a Receita Federal dos EUA.

A alíquota real do imposto de renda federal pago pelos 400 contribuintes mais ricos do país, ou seja, o 0,000258% mais rico da população, caiu de cerca de 30% em 1995 a 18% em 2008, o ano mais recente sobre o qual existem dados.

"Há muita verdade na ideia de que o código tributário que se aplica ao 1% é muito diferente do código tributário dos 99%", diz Victor Fleischer, professor de Direito na Universidade do Colorado.

"Um contribuinte que tenha a sorte de contar com propriedades que se valorizaram, em geral, só pode escolher entre vendê-las e pagar impostos ou retê-las e correr os riscos que a oscilação do mercado acarreta. Apenas os verdadeiramente ricos podem usar derivativos e conseguir o melhor dos mundos -muito dinheiro e baixo risco."

ARTE

Como acontece com muitos colecionadores de arte, Lauder pode deduzir dos impostos o valor total de obras de arte doadas a museus.

Alguns grandes colecionadores são criticados por usar benefícios tributários para facilitar a montagem de grandes coleções que oferecem pouco acesso ao público.

Lauder, no entanto, recebe grandes elogios por fazer de suas obras de arte um ativo para a comunidade.

Alguns defensores da reforma tributária dizem que é injusto que as pessoas mais ricas possam subsidiar seus estilos de vida utilizando inúmeras manobras internacionais e estratégias contábeis complexas.

"É admirável que as pessoas concretizem seus impulsos de caridade na forma de doações", disse Scott Klinger, diretor de política fiscal do Business for Shared Prosperity, grupo que defende a reforma tributária.

"Mas o código tributário não deveria permitir que os ricos explorem tantas lacunas, o que na prática força os demais contribuintes a subsidiar doações às causas que agradam a eles."

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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