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Entrevista Ricardo Loureiro

Redução de calote dá mais resultado que corte do IPI

Queda de 20% da inadimplência recuperaria r$ 15,8 bi em um ano, 3 vezes a renúncia fiscal com imposto de veículos, diz especialista

CAROLINA MATOS
DE SÃO PAULO

A redução de 20% dos calotes aos bancos injetaria na economia do país, em um ano, R$ 15,8 bilhões, o equivalente a mais que o triplo do que o governo deixaria de arrecadar no período mantendo a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de veículos.

A projeção é de Ricardo Loureiro, presidente da Serasa Experian, empresa de informações financeiras, e considera a inadimplência bancária total em 2011 (R$ 79 bilhões) e a estimativa de renúncia fiscal do imposto, de R$ 1,2 bilhão em três meses ou R$ 4,8 bilhões em um ano.

Na avaliação do executivo, essa diminuição dos calotes é possível em um prazo de 18 a 24 meses após a entrada em vigor do cadastro positivo, que será um banco de dados com informações sobre os pagamentos em dia feitos pelos consumidores.

Em um horizonte mais longo, de quatro anos, a redução pode chegar a 45%, afirma.

Na avaliação de Loureiro, a renúncia fiscal para estimular o consumo no curto prazo "é válida, mas um cinto apertado", pois representa recursos que deixarão de ser investidos pelo governo.

O novo cadastro, aprovado no ano passado, ainda depende de regulamentação.

A Serasa Experian deverá ser uma das empresas a administrar o banco de dados. Leia a seguir trechos da entrevista exclusiva à Folha.

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Consumo

O governo tem tomado diversas medidas para estimular a economia. Entre elas, a isenção do IPI de veículos. E tem de fazer isso mesmo.

Vale a pena, no entanto, abordar a questão do ponto de vista da eficiência. Sempre que se abre mão de um recurso por meio de renúncia fiscal, isso significa um investimento que não vai ser feito. Trata-se de medida de curto prazo válida, mas é um cinto apertado.

Por outro lado, a inadimplência, resultado de um processo de ineficiência, é muito onerosa para nós.

Somente em 2011 os bancos tiveram calotes de R$ 79 bilhões -dinheiro perdido, que não volta para a economia.

Juros altos

Os bons pagadores acabam arcando com essa conta da inadimplência total, sendo punidos com juros que poderiam ser bem menores se as instituições pudessem medir o risco individualizado, o que vai ser viável com o cadastro positivo.

Com o banco de dados sobre as contas pagas em dia, a pessoa terá a própria reputação a seu favor no momento de negociar taxas de juros.

Combatendo a inadimplência, além de aumentar o volume de recursos em circulação na economia, se estimula o consumo em um horizonte longo, e não apenas no curto prazo.

Cadastro positivo

Com base no que ocorreu em países que adotaram a ferramenta, acredito que seja possível, no Brasil, reduzir a inadimplência em 20% ao ano num prazo de 18 meses a dois anos do cadastro em vigor.

Isso representaria R$ 15,8 bilhões a mais circulando na economia em um ano, ou mais que o triplo da renúncia fiscal do governo com o IPI de veículos no mesmo período.

Em três ou quatro anos de vigência do cadastro, o percentual de redução dos calotes poderia chegar a 45%.

Concorrência bancária

Num cenário de mais concorrência entre os bancos, as instituições financeiras terão todo o interesse em usar a ferramenta de avaliação individualizada do risco para ganhar mais clientes, oferecendo juros menores.

Um terço do "spread" bancário [diferença entre as taxas de juros pelas quais os bancos captam o dinheiro para emprestar aos clientes e as que cobram dos consumidores] é composto pelo custo com inadimplência.

O Brasil é o único do G20 [grupo das maiores economias do mundo] que não tem o cadastro positivo. E também o único entre os Brics, que incluem ainda Rússia, Índia, China e África do Sul.

'Antessala das perdas'

Não podemos deixar para tomar essa atitude [adotar o cadastro] depois de a situação sair do controle.

O índice de atrasos de pagamento de dívidas bancárias acima de 90 dias no Brasil, que é uma espécie de antessala das perdas com crédito, está em 7,6%. Já foi pior e, em sua melhor marca nos últimos anos, chegou a 5,7% em 2010.

Esse índice é maior que o de outros emergentes, como Rússia (5,1%), Índia (5,9%) e China (1,3%). Até a Espanha, que está com sérios problemas na economia, tem número um pouco menor que o nosso (7,3%). Nos EUA, são 2,9%.

Perfil de crédito

O que vemos no Brasil hoje não é inadimplência por falta de condições de pagamento, pois estamos em um cenário de quase pleno emprego e renda crescente.

Na grande maioria dos casos, o que existe é um monte de gente se atropelando e não conseguindo honrar os compromissos porque deu um passo maior que a perna.

O cadastro positivo, além de ajudar os bancos a entender o perfil de crédito do cliente, vai auxiliar o consumidor a conhecer sua capacidade de pagamento, pois será um registro de todo o histórico das contas dele e evitará que ele se superendivide.

O nível de comprometimento de renda com dívidas considerado saudável é de até 30%. No Brasil, está em 22%.

O consumidor que não tem acesso a crédito é "meio cidadão". É a partir do crédito que a maior parte das pessoas consegue comprar uma casa, um carro, montar um negócio, pagar o estudo dos filhos.

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