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"Falta ao país vocação para a poupança", avalia economista

Para Eduardo Giannetti, Brasil repete padrão histórico de estimular gastos sem investir para aliviar os gargalos

Professor aponta ainda a "arriscada dependência" do consumo externo em que país se apoia

Gabo Morales/Folhapress

CAROLINA MATOS
DE SÃO PAULO

A falta de poupança interna, que restringe a capacidade de investimento do país em pilares essenciais ao crescimento de longo prazo -como educação e infraestrutura-, é o grande entrave ao desenvolvimento econômico.

A avaliação é de Eduardo Giannetti, 55, economista, filósofo e professor do Insper.

O problema, histórico, está camuflado por uma superfície de expansão do consumo e longe de ser resolvido.

"A nova classe média demanda eletrodomésticos, mas a energia elétrica é cara e falta em muitos locais", diz.

O mesmo contrassenso pode ser observado de várias formas: cresce o interesse dos consumidores por carros, faculdades e imóveis, mas falta investimento em vias, ensino de qualidade e saneamento básico.

Ainda na avaliação do economista, no cenário de crise na Europa e desaceleração da China, está mais arriscada a dependência da economia brasileira em relação à demanda externa por commodities, como alimentos e metais. A seguir, trechos da entrevista exclusiva à Folha.

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Falta de vocação

A economia brasileira é muito parecida com um personagem do conto "O Empréstimo", de Machado de Assis, que tem vocação para a riqueza, mas não para o trabalho. O país tem a vocação do crescimento, mas não a da poupança.

O Brasil tenta repetir a estratégia adotada para sair da crise em 2008 e 2009, só que o contexto agora é muito diferente. Há um comprometimento da renda das famílias com dívida, que já não têm a mesma condição de comprar.

Além disso, aquele deslumbramento inicial da nova classe média com as possibilidades de consumo começa a dar sinais de fadiga. O que o Brasil precisa é pensar com muito mais cuidado em como aumentar a poupança e o investimento [em torno de 17% e 19% do PIB em 2011, respectivamente], e não o consumo.

Capacidade de produção

Um dos dados mais preocupantes da economia hoje é que a formação de capital fixo [maquinário e instalações das empresas] caiu. Esse é um dos fatores que têm levado o Produto Interno Bruto a crescer pouco. Agora, para atender a demanda interna, vai ser preciso, portanto, fazer o PIB crescer por investimento.

Toda a economia tem o chamado "speed limit", que é o limite de velocidade que ela pode alcançar e manter sem gerar desequilíbrios macroeconômicos, como a disparada da inflação.

As melhores estimativas do "speed limit" do Brasil hoje ficam entre 3,5% e 4% ao ano. Mas o fato é que estamos, pelo segundo ano consecutivo, abaixo dessa faixa. Neste ano, muito provavelmente, com um número próximo a 2%.

Dependência externa

De 2004 a 2011, o PIB brasileiro cresceu, em média, 4% ao ano. Mas a absorção doméstica, que é o gasto total do Brasil [setores público e privado], cresceu, em média, 5% ao ano. Ou seja, todo ano, o gasto aumentou um pouco mais do que a produção.

Dois fatores permitiram que isso acontecesse sem gerar, por exemplo, uma pressão inflacionária. Primeiro, uma melhora dos termos de troca do Brasil: o preço dos produtos que vendemos para o mundo, principalmente das commodities, aumentou mais que o preço do que importamos, como insumos e máquinas.

O outro fator foi que, depois de anos em que tivemos superavit em conta-corrente [resultado das transações do país com o exterior], passamos a ter deficit em conta-corrente, que, hoje, é da ordem de 3% do PIB. Esse segundo componente é a poupança externa, dinheiro que o mundo passou a transferir para nós.

Só que não vai dar para continuar com o consumo crescendo a não ser que a gente passe a ter deficit cada vez maior em conta-corrente, pois não vamos mais contar com a melhoria dos termos de troca.

Se o preço das commodities se mantiver onde está, já será um ótimo cenário, pois o perigo é que ele caia, diante da crise na Europa e da desaceleração da China, importante consumidora.

E aí vamos para um território muito perigoso: no caso de qualquer parada no financiamento externo, o país vai para a beira do abismo. É o risco do abuso da poupança externa.

Leia a íntegra da entrevista
folha.com/no1129906

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