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Entrevista finanças

Concentração está no DNA dos bancos, diz economista

Para autor, ter escala e acesso popular é estratégico para as instituições

ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO

Os bancos precisam olhar além dos milionários da "elite branca" e massificar sua clientela para ter sucesso no Brasil. Essa é uma das teses centrais de Fernando Nogueira da Costa, 60, em "Brasil dos Bancos", que conta a história do sistema nacional.

Ex-mestre de Dilma Rousseff, professor de economia da Unicamp e ex-dirigente da Caixa e da Febraban (federação dos bancos), ele diz que a concentração está no DNA dos bancos e não significa competição menor. Confira.

Folha - A crise estimula a concentração bancária?
Fernando Nogueira da Costa - É parte do DNA dos bancos a concentração. É uma ingenuidade histórica essa discussão nos EUA de que é preciso fragmentar os bancos para que eles não sejam grandes demais para quebrar. Os clientes querem bancos grandes demais que não possam quebrar.
O que é diferente de dizer que banqueiro não pode quebrar. Bancos precisam ser fiscalizados, regulados. A concentração não significa diminuição de competição.

Não?
Não. Fragmentar os bancos acaba sendo um custo social superior. Não há como um banco não ser muito capitalizado para ser solvente e seguro. Banco pequeno é de negocio, de gestão de fortuna.

Foi descoberto o escândalo da Libor, há o caso do dinheiro sujo no HSBC, o JPMorgan teve perdas. Há uma lógica nesse conjunto de notícias?
A lógica da liberalização anterior, quando a fiscalização se afrouxou, deixando a autorregulação para o mercado. Se não há limite, há maximização dos ganhos, bônus, levando a fraudes e manipulações.

No livro o sr. afirma que os bancos que se voltam apenas à "elite branca" se tornam insignificantes. O sr. escreve "embranquece, enriquece, desaparece". Por quê?
Lembrei o governador Claudio Lembo. Há uma concentração absurda de renda, que melhorou, mas a história não foi ultrapassada. Houve uma mobilidade maior e o número de milionários cresceu.
O conceito de milionário foi mudando; agora é o "trimilionário". Cerca de 50 mil clientes têm pelo menos R$ 1 milhão aplicados. Isso é a concentração de riqueza.

Mas por que um banco, para ter sucesso, tem que necessariamente se voltar para o conjunto da população no Brasil?
O título que escolhi, "Brasil dos Bancos", tem uma ironia. Mas o sentido que eu dou é que a historia bancária não pode ser segregada da de seu povo. Não pode ser voltada para essa elite diminuta, que foi o erro estratégico dos bancos estrangeiros.
Quando o banco dá acesso popular, fica com uma escala de clientes imensa. Os clientes ficam dentro do sistema e o banco passa a ser um criador de moeda interno. Dar escala e dar acesso popular é estratégico.

Como o sr. analisa a tensão entre governo e bancos?
É um avanço histórico fomentar a competição via Banco do Brasil e Caixa. Não é fragmentando o sistema bancário e abrindo as fronteiras que se aumenta a competição. Essa foi a tentativa dos anos 1990 e deu em nada. Nos anos 1980 deu em crise bancária e a desnacionalização.
Os bancos vieram e poucos ficaram. Banco precisa de fiscalização. No Brasil, 45% do crédito está nos bancos públicos -os privados têm 38%, e os estrangeiros, 17%.

No livro o sr. critica a demonização dos bancos. Por que ela existe?
Eu me considero de esquerda, mas nunca demonizei banqueiro. As razões para a demonização não são justas. Há razões históricas -a crítica da igreja católica aos juros.
Há um desconhecimento da população, que acha que o banqueiro é um explorador porque paga menos juros do que cobra. Qualquer negócio tem que dar lucro. É preciso cobrar uma regulação, não fazer critica ao banqueiro.

Mas a rentabilidade dos bancos aqui não é maior do que no exterior?
O "spread" brasileiro é extraordinariamente maior que o resto do mundo. Uma das razões é a memória inflacionária, uma tradição de uma economia instável. A automação bancária é um fator de rentabilidade muito grande.

A desnacionalização dos 1990 foi ruim para o país?
Sim. Não trouxe nenhuma inovação, os juros não caíram. Mas a entrada do Santander fomentou a reação dos grandes nacionais. A aquisição do Real pelo Santander levou o Itaú a negociar com o Unibanco. A competição fomentou a concentração.

BRASIL DOS BANCOS
AUTOR Fernando N. da Costa
EDITORA Edusp
QUANTO R$ 74 (532 págs.)

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