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Samuel Pessôa

PIB pior do que o esperado

A retomada virá pela maior demanda doméstica; assim, o setor de serviços liderará o crescimento brasileiro

Na sexta-feira o IBGE divulgou o resultado das contas nacionais trimestrais. O principal número esperado pelos analistas e investidores é a taxa de crescimento do PIB do segundo trimestre ante o primeiro, já corrigida da sazonalidade. O crescimento foi de 0,41%, o que significa aumento anualizado de 1,63%, não muito diferente das expectativas de mercado para o avanço em 2012 em comparação ao nível médio do PIB em 2011. O resultado foi um pouco abaixo das expectativas.

Quando olhamos a composição do crescimento do PIB, o problema é que não parece que houve alteração das dinâmicas que têm caracterizado a economia brasileira de 2010 para cá. Em seguida à forte recuperação em 2009, quando a indústria, a agricultura e os serviços se recuperaram, a partir do primeiro trimestre de 2010 a indústria passou a andar de lado.

A parada da indústria é simultânea à parada das economias do Atlântico Norte, que também perderam dinamismo em seguida a uma recuperação que poderia ter tido maior fôlego. Com se sabe, diversos problemas na Europa e nos EUA impediram a plena retomada dessas economias e, assim, metade da economia mundial patina desde então.

As dificuldades dos países desenvolvidos atingiram diretamente nossa economia. Por um lado, a demanda mundial por bens manufaturados caiu muito e, por outro, apareceu um excedente exportável nas economias centrais que passou a ser direcionado para o nosso mercado.

O reequilíbrio da economia mundial a partir de 2010 teve dois impactos sobre nossa economia. Primeiro, a fortíssima redução dos preços dos bens manufaturados -consequência do excesso de oferta desses bens no mercado externo- permitiu estabilizar a inflação brasileira, mesmo que um pouco acima do centro da meta, com juro real muito mais baixo do que o período anterior à crise de 2008. Esse é o efeito colateral positivo do excesso de oferta mundial de manufaturados.

O efeito colateral negativo foi um padrão de crescimento liderado pelo setor de serviços que explica parte da redução de dinamismo da economia e, principalmente, explica as dificuldades da indústria de transformação.

Em meados do ano passado apareceram dinâmicas internas que produziram redução adicional na demanda doméstica, fato não muito comum em nossa economia, que normalmente se defronta com situações de excesso de demanda e pressão inflacionária permanente.

A deterioração das expectativas com a perspectiva de piora na Europa, associada à forte acumulação de estoques na indústria devido à frustração da demanda desde 2010, reduziu o investimento. A redução dos estoques gerou menos encomendas, e a crise de excesso de endividamento das famílias, com forte elevação da inadimplência, reduziu a taxa de crescimento do consumo.

A soma desses três efeitos -redução do investimento, ciclo de estoques e desaquecimento do consumo- explica a piora da atividade da economia adicionalmente à piora explicada pelo esfriamento da demanda externa.

A economia internacional irá continuar ruim por muito tempo. Assim, nos próximos anos continuaremos a observar excesso de oferta de bens manufaturados para cá, bem como carência de demanda no resto do mundo por nossos manufaturados.

A retomada da economia resultará da elevação da demanda doméstica. Portanto, continuaremos a conviver com um modelo de crescimento liderado pelo setor de serviços. A composição setorial do crescimento do segundo trimestre ante o primeiro sugere que esse é o caso.

Os serviços e a agropecuária contribuíram para o crescimento, mas indústria de transformação, construção civil e indústria extrativa mineral andaram para trás. Pela ótica da demanda, o crescimento foi puxado pelo consumo das famílias e da administração pública. O investimento e a demanda externa puxaram para trás.

A nota negativa foi o forte processo de acumulação de estoques. Parece-me que se trata da contrapartida do baixo investimento. Devido aos sinais fracos de recuperação do setor da construção civil, parece-me que ainda teremos problemas com esse componente da demanda por algum tempo. Motivo adicional para toda a recuperação depender do consumo.

SAMUEL PESSÔA é doutor em economia e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV.

AMANHÃ EM MERCADO
Marcia Dessen

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