São Paulo, domingo, 02 de janeiro de 2011

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FÁBIO BARBOSA

Tempos de inclusão


Nossa prioridade deve ser corrigir as distorções pelas quais uma parte do país cresce e outra fica para trás

NÃO DÁ para irmos bem, indefinidamente, num país que vai mal! Com essa frase, tenho há tempos procurado provocar algumas reflexões. Sempre reforço a provocação dizendo que blindar carros e subir muros de condomínios não é a solução para os problemas.
Nossa prioridade como sociedade deve ser corrigir as distorções que existem há séculos, em que apenas uma parte do país cresce e outra fica para trás. O país que valoriza muito tudo aquilo que é exclusivo (produtos, serviços e lugares) precisa passar a ser o país da inclusão.
Esse problema é crônico no Brasil e teve seu momento de pico à época da escravidão -certamente o maior mal da nossa história, com feridas abertas até hoje.
Em tempos mais recentes, a inflação foi o mal que manteve essas distorções, prejudicando os já menos favorecidos. A estabilização da moeda, a maior eficiência na economia, os programas sociais e a própria disseminação do crédito tiveram o mérito de começar a mudar de forma relevante esse quadro nas últimas duas décadas.
Como tem sido noticiado, cerca de 33 milhões de pessoas ingressaram na classe média brasileira desde o início da década, passando a fazer parte do chamado mercado consumidor.
Bom para todos, pois essas pessoas conquistaram uma qualidade de vida melhor e novas oportunidades de negócios surgiram. Na verdade, ganhamos como sociedade ao caminharmos um pouco mais na construção de um país mais digno.
Esse movimento de inclusão não é particularidade da sociedade brasileira, pois pode também ser observado em escala global.
O mundo viveu nos últimos 200 anos um crescimento econômico incomparável. Segundo estudo feito por Hans Rosling, médico sueco, em 1810 a expectativa de vida numa ampla amostra de países era baixa (ao redor de 40 anos), mas com pouca dispersão em torno dessa média.
Ao longo de dois séculos, todos melhoraram. Entretanto, a diferença entre os países aumentou brutalmente, variando de 50 a mais de 80 anos, e só recentemente passou a convergir timidamente. Apesar de não uniforme, é de se valorizar esse desenvolvimento.
O que chama a atenção aqui é a similaridade entre o fenômeno relativamente recente da inclusão de consumidores no cenário brasileiro e a inclusão de novos países no desenvolvimento mundial. China, Índia, Indonésia, Vietnã e o próprio Brasil são como a nova classe emergente entrando no jogo global.
A ampliação do consumo de massa certamente é o denominador comum da transformação que estamos vivendo. Com isso está vindo uma demanda por mais informação, por melhores condições de vida e por maior participação nas grandes discussões.
No Brasil já existe um rearranjo das forças políticas por conta desse movimento. No mundo isso também acontece. O mundo bipolar (EUA e URSS) do pós-Guerra deu lugar inicialmente ao G7, e agora ao G20. O fenômeno deve acelerar-se, pois vemos que, enquanto na Europa se discute a manutenção das pensões, nos países emergentes constroem-se universidades.
Cresceu a importância de várias economias, assim como a consciência de que vivemos num mundo interdependente. Assuntos como ambiente, fluxos migratórios, fluxos financeiros não se resolverão a partir de decisões tomadas de forma independente por qualquer país.
Em breve, ainda teremos que lidar com os alertas dos estudos que indicam que, se todos os habitantes do planeta tivessem um padrão de consumo semelhante ao de um cidadão norte-americano, os recursos naturais seriam insuficientes.
Seja em termos locais, seja em termos globais, vivemos uma nova era. Essa é a era da inclusão, da participação, da disseminação da informação, da busca da igualdade de oportunidades.
A complexidade de lidar com esse mundo da inclusão é muito maior e ao mesmo tempo fascinante, pois reflete o fato de estarmos construindo um mundo melhor e mais digno. Enfim, não dá para poucos irem bem num mundo que vai mal!

FÁBIO COLLETTI BARBOSA, 55, administrador de empresas, é presidente do Grupo Santander Brasil e da Febraban. Escreve mensalmente, aos domingos, neste espaço.

colletti.barbosa@gmail.com

AMANHÃ EM MERCADO:
Gustavo Cerbasi


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