São Paulo, sábado, 03 de setembro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ANÁLISE PREÇOS

Banco Central decide baixar a guarda e aumenta incertezas


AS EXPECTATIVAS INDICAM QUE O CUMPRIMENTO DA META DE INFLAÇÃO NO BRASIL NÃO SE DARÁ NESTE NEM NO PRÓXIMO ANO

GERALDO BARROS
ESPECIAL PARA A FOLHA

As expectativas econômicas costumam funcionar como profecias autorrealizáveis. Por isso, a essência do regime de metas de inflação está em manter -através de medidas concretas que confiram credibilidade às autoridades- as expectativas constantemente perto da meta.
Não é o que vem acontecendo no Brasil: as expectativas indicam que o cumprimento da meta não se dará neste nem no próximo ano.
As recentes decisões das autoridades econômicas brasileiras não contribuem para direcionar a inflação em direção à meta e podem estar desgastando severamente a credibilidade e, portanto, a eficácia do regime, que até aqui vinha sendo bem-sucedido.
O Banco Central e o Ministério da Fazenda aparentemente concatenaram uma ação conjunta visando mudar o mix da política macroeconômica, conjugando um pouco confiável aperto fiscal a uma política monetária certamente mais frouxa, o que, no balanço, deveria manter o esforço -já não tão forte- de controle da inflação.
Parece ter faltado, porém, o mesmo entendimento com o Ministério do Planejamento, cuja proposta orçamentária eleva as despesas de custeio em 15,9%, bem acima do crescimento previsto para o PIB (Produto Interno Bruto).
O BC, porém, não se perturbou com essa inconsistência e se apressou em reduzir os juros básicos em meio ponto percentual, surpreendendo a maioria dos agentes e analistas de mercado.
Teve, porém, de justificar sua decisão não tanto com base no acerto com a área fiscal, mas, sim, fundamentalmente com base no pior cenário possível para a crise internacional, ou seja, a reedição do ocorrido há três anos.
É improvável, porém, que se repitam impropriedades como a que levou à quebra do Lehman Brothers e o rompimento dos canais interbancários.
Isso quer dizer que o que não vai faltar é liquidez no mercado internacional, enquanto prosseguem as penosas e complexas negociações para serem vencidas as dificuldades de curto prazo e definidos programas de longo prazo que resgatem a sustentabilidade fiscal nos Estados Unidos e na União Europeia.
Além disso, é improvável que, por causa da crise, os países emergentes e em desenvolvimento sofram a ponto de sacrificar o consumo de commodities, principalmente alimentos e petróleo, ambos com oferta restrita e incerta e com demanda ainda bastante firme.
Internamente, a economia segue em crescimento, que, embora mais lento, ainda viabiliza altas expressivas de preços nos segmentos de serviços, do atacado e ao consumidor, como indicou a FGV com seu índice IGP-M, que subiu 0,44% em agosto.
Seguindo influência externa, entre os produtos agrícolas mantêm-se em alta o açúcar, a soja, o café e as carnes. A produção de etanol não consegue acompanhar a demanda, e a Petrobras conta os dias para reajustar os preços da gasolina.
A taxa de inflação segue fora da meta, com o IPCA-15 do IBGE acima de 7% nos últimos 12 meses.
Perguntas que não querem calar: o Banco Central abandonou o programa de metas de inflação?
Se não, como vai fazer para trazer as expectativas para perto da meta de 4,5%?
Se sim, quais são os novos parâmetros para inflação e crescimento econômico? O clima de dúvidas e de incertezas não pode perdurar.

GERALDO BARROS é professor titular da USP/Esalq e coordenador científico do Cepea/Esalq/USP.


Texto Anterior: Projeto quer atrair usinas de etanol ao semiárido
Próximo Texto: Vaivém - Mauro Zafalon: Álcool deixa de ser competitivo em São Paulo
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.