São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2010

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ALEXANDRE HOHAGEN

Dinossauros míopes


A tecnologia é real, atual, sem espaço para meias verdades; goste ou não, ela é um retrato da realidade

IMAGINE QUE você esteja à procura de uma vaga de estacionamento numa das cidades mais movimentadas do mundo. Ao passar perto de seu local de destino, um sistema de localização de vagas identifica onde seu carro está e uma mensagem de texto é enviada automaticamente para o seu celular. Nela aparecem a indicação da vaga disponível mais próxima, o horário de funcionamento e o valor do estacionamento.
Ao mesmo tempo, imagine que os índios da Amazônia queiram monitorar o nível de desmatamento da floresta a partir da localização de atividades ilegais encontradas por eles no meio da selva.
Os dois exemplos acima são reais e mostram o potencial que a tecnologia tem para melhorar a qualidade de vida da sociedade em situações tão distintas. São reflexo de duas tendências tecnológicas que estão se tornando fundamentais.
A primeira situação diz respeito ao processo colaborativo entre homens e máquinas, que muitos chamam de computação humana. A segunda mostra que, nos dias de hoje, basta compartilhar informações para alcançar uma melhora significativa de alguns serviços. A cidade de Nova York percebeu que 45% de seu trânsito é causado por carros dando volta nos quarteirões à procura de vagas para estacionar. Para combater esse problema, um serviço de mensagens com as vagas disponíveis já está em funcionamento para quem se dispuser a informar sua localização.
Já os índios suruís, da Amazônia, passaram a utilizar aparelhos portáteis de GPS para monitorar a floresta. Ao serem acionados pelos índios, os equipamentos identificam as áreas de desmatamento, que são fotografadas por satélites e ficam disponíveis no Google Earth, de modo que a sociedade possa acompanhar situações irregulares. Mesmo com todos esses avanços, me espanta que, passada a primeira década do século 21, alguns dinossauros ainda se movam com tamanha lentidão ao questionar a realidade que a tecnologia faz emergir diante dos nossos olhos.
E que outros tantos ainda não se deem conta de que algumas das melhores tecnologias são, sim, disruptivas, tão questionadoras que conseguem quebrar algumas barreiras. Recentemente, o Google lançou no Brasil o serviço que disponibiliza imagens de ruas e avenidas pelo Google Street View. Apesar dos incontáveis benefícios que traz com seu apurado serviço de geolocalização, muitos se incomodaram porque as imagens registram algumas situações que -gostemos ou não- são absolutamente verdadeiras. É o mesmo que pedir a um míope que tire os óculos para não enxergar a sujeira das ruas, em vez de limpá-las.
A tecnologia não altera a realidade. Ao contrário: expõe situações reais e ajuda a resolver problemas. Com quase 1,5 bilhão de pessoas conectadas em todo o mundo, a capacidade criada para que qualquer pessoa possa ajudar a aprimorar um produto ou serviço digital se multiplicou de forma significativa.
Durante muito tempo, as principais bibliotecas do mundo sofreram por não conseguir digitalizar obras antigas, raras e que tantas vezes têm suas páginas desgastadas e palavras indecifráveis. Pois um jovem professor guatemalteco chamado Luis von Ahn, da Universidade Carnegie Mellon (EUA), criou uma tecnologia que combina as inteligências humana e dos computadores para resolver o problema.
Sempre que o sistema de escaneamento de livros das bibliotecas não identifica uma palavra, ela é lançada na web como um código de segurança, similar àquelas letras tortas e sem sentido que às vezes temos de digitar para navegar em alguns sites. Até para os computadores mais avançados, essas palavras são indecifráveis (pela falta de parte de uma letra, por exemplo).
Para os nossos olhos, no entanto, não. Depois que algumas pessoas identificam a palavra, o sistema entende que há um significado atrelado a ela -e a inclui na parte do livro onde estava ilegível.
Assim é a tecnologia: real, atual e disruptiva. Sem espaço para meias verdades ou algum tipo de disfarce. Gostemos ou não, a tecnologia é um retrato da realidade.


ALEXANDRE HOHAGEN, 42, jornalista e publicitário, fundou a operação do Google no Brasil em 2005 e desde 2009 é presidente da empresa na América Latina. Escreve mensalmente, às quintas-feiras, nesta coluna.

colunadohohagen@gmail.com


AMANHÃ EM MERCADO:
Luiz Carlos Mendonça de Barros


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