São Paulo, segunda-feira, 06 de junho de 2011

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ENTREVISTA DA 2ª

Cinema descobre classe C e cresce 51% em 3 anos

PRESIDENTE DO CINEMARK DIZ QUE SALAS NO BRASIL DEPENDEM EXCLUSIVAMENTE DA EXPANSÃO DOS SHOPPINGS CENTERS

MARIANA BARBOSA
DE SÃO PAULO

Depois de anos de estagnação, o público do cinema nacional cresceu 51,4% entre 2008 e 2010, quando foram vendidos 134,9 milhões de ingressos. Ascensão da classe C, tecnologia 3D, além de uma boa safra de sucessos de bilheteria têm contribuído para que o cinema seja incorporado ao lazer do brasileiro.
Mas, na opinião de Marcelo Bertini, presidente da Rede Cinemark Brasil, exigências legais como meia-entrada e cota de tela (reserva de mercado para o cinema nacional), além dos custos para se investir em cinema de rua limitam o crescimento potencial da indústria.

 

Folha - O cinema vive um bom momento no Brasil?
Marcelo Bertini
- Essa é uma indústria que não controla o que exibe. E o ano passado foi muito consistente em termos de produto. Tivemos Avatar, bons produtos no verão americano, e o maior sucesso da história recente do cinema nacional, que foi Tropa de Elite 2.

A classe C está indo ao cinema?
Entre os anos de 2006 e 2008, enquanto a economia cresceu movida pelo crédito para a classe C, nós ficamos estagnados, com 89 milhões de ingressos vendidos. A gente não crescia pois a renda da classe C estava comprometida com o primeiro celular, primeiro carro, primeira geladeira.
Mas agora acredito que a classe emergente está aprendendo a equilibrar o orçamento e sobra mais dinheiro para lazer.

O preço do ingresso não é uma barreira?
A gente não percebe isso. Tirando atividades patrocinadas pelo governo, o cinema é talvez o entretenimento mais barato do Brasil. O que é que custa R$ 16, R$ 18 o preço cheio? Ingresso de futebol custa R$ 30. Considerando a meia entrada, o preço médio real da indústria é R$ 9. Mas infelizmente a meia-entrada não beneficia só estudantes, mas também pessoas que há tempos não vão à escola.

O setor ainda briga para acabar com a meia-entrada?
Tivemos uma briga com as empresas que comercializavam as carteiras e ganhamos na Justiça. Hoje precisamos coibir a falsificação. Para isso é preciso regras, definir que tipo de curso, qual horário.
Defendemos a adoção de um documento de fé pública, emitido pela Casa da Moeda.
A meia-entrada é um custo imposto pelo Estado para o empresário, sem nenhum tipo de contrapartida. Além dos impostos que a gente já paga, é como se essa fosse a minha participação no desenvolvimento cultural do país. Esse tipo de conceito não vale a pena questionar.
Mas queremos que a carteira seja regulamentada.

Qual o peso da meia-entrada?
De 60% a 65% de todos os ingressos vendidos.

Outros países também adotam meia-entrada.
Poucos. A França tem, mas é patrocinada pelo governo. EUA e México não têm. O México tem o dobro do número de salas do Brasil, recebe o dobro do público e tem a metade da população.

Mas o ingresso no México é muito mais barato.
Sim, pois não há meia-entrada.

Dá pra atribuir o preço baixo no México só à meia-entrada?
Dá. No Brasil, nosso preço mais baixo é em Porto Alegre. Lá a meia entrada é regulamentada de fato. Há um desconto menor no fim de semana e maior durante a semana.
O preço cheio lá é menor do que no resto do país, mas o médio é o mesmo. O resultado é um entretenimento mais barato e mais abrangente. E Porto Alegre tem um dos maiores números de salas por habitante do país.

Como competir com TV HD, home theater, downloads?
A migração da projeção de 35mm para o digital, com a tecnologia 3D é uma alternativa que nos coloca em pé de igualdade para competir não só com novas tecnologias, mas com novos conteúdos.

O 3D é capaz de fazer as pessoas saírem de casa?
O que faz sair de casa continua sendo o cinema. E um filme 3D não é necessariamente um filme vencedor.
Mas dependendo do público que você quer atingir -garotada que gosta de filme de ação, famílias-, o 3D potencializa o desejo do cliente sair de casa. Estamos fazendo grandes investimentos na compra de projetores digitais. Das 433 salas que temos hoje, 117 já contam com projetores digitais.

Como o sr. vê o potencial do mercado nacional?
É enorme, mas poderia ser maior. Não conseguimos viabilizar aqui o que nos EUA foi o propulsor da indústria: cinema fora de shopping.

Por que não se investe em cinema de rua?
Terreno caro, péssimas condições de financiamento de longo prazo para terreno e investimento. E ainda tem um custo adicional de infraestrutura, como estacionamento e segurança. Sem falar nas exigências de prefeitura, bombeiro, taxas.

O setor então depende do crescimento dos shoppings?
A indústria de shoppings fala em 90 novos empreendimentos até 2015. Se isso se confirmar, serão 600 salas. Sairemos de 2.200 salas para 2.800. É pouco perto do México, que tem 4.100.

Qual a sua avaliação sobre a produção nacional?
Não julgo qualidade, falo em termos comerciais. O que temos observado é que ao menos uma parte de nossos diretores e produtores está finalmente começando a tratar a indústria como negócio. Começando a entender o que de fato interessa ao público.
Acertamos nas comédias românticas ou genuínas. Tirando Tropa de Elite, as grande bilheterias têm esse viés.

Essa produção é suficiente para cumprir a cota de tela?
Ih! A cota de tela dá uma entrevista à parte. No Brasil são lançados de 70 a 90 filmes por ano. Só uns 5 interessa ao mercado assistir.

Dá para cumprir a cota com esses títulos?
A produção não é suficiente para cumprir a cota de forma rentável. Cumpro com sala vazia. Em 2010, em função do sucesso de Tropa, não foi o caso. Mas na maioria dos anos, sim. De cada seis ou sete salas, sou obrigado a dedicar uma a filmes nacionais.

E vocês exibem só esses 5?
Mais do que isso. Entendemos que muitos filmes têm o seu público. Também temos festivais, projetos, como o Projeta Brasil, um dia inteiro dedicado ao cinema nacional com ingresso a R$ 2. Essa renda retorna para a indústria, com premiações em festivais.


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