São Paulo, quarta-feira, 06 de outubro de 2010

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ANÁLISE

Câmbio em baixa é sintoma da embriaguez do pleno emprego

ROBSON GONÇALVES
ESPECIAL PARA A FOLHA

O governo brasileiro finalmente adotou uma medida clara no sentido de conter a valorização cambial. Dobrou a alíquota do IOF sobre os capitais de curto prazo que têm ingressado no país para aplicação em renda fixa.
No entanto, a efetividade desse tipo de medida para conter a queda do dólar é muito limitada no contexto atual. Em todo o mundo, capitais de curto prazo movem-se devido às diferenças de taxas de juros. E, hoje, o Brasil pratica taxas de dois dígitos em um contexto de baixo risco-país.
Somem-se a isso as taxas próximas de zero que vigoram nos principais mercados internacionais e o ingresso de capitais especulativos torna-se quase inevitável. Taxar essas operações em 4% não é uma medida capaz de reverter essa dinâmica.
Mas, a realidade é que o câmbio é apenas a ponta do iceberg. Os fundamentos da economia estão desalinhados e esse desajuste tem sido encoberto pela atual embriaguez do pleno emprego vivida no país, fenômeno raro tanto em nossa própria história como no mundo hoje.
A única via segura para evitar a valorização excessiva do real seria uma combinação de medidas que tornasse possível reduzir os juros de forma sustentada, sem comprometer o cumprimento das metas de inflação.
Vasculhando os manuais de economia de todas as vertentes, encontra-se sempre a mesma recomendação: a redução dos gastos públicos.
Na atualidade, o crescimento excessivo da demanda pressiona a alta de preços. O BC, então, cumpre seu papel e eleva a Selic para encarecer o crédito e frear a inflação. O efeito colateral é a atração de capitais especulativos e o tombo cambial.
Uma política fiscal mais austera, sobretudo com cortes de custeio -não de investimentos-, contribuiria com a contenção da demanda.
A baixa da inflação tornaria viáveis cortes consistentes de juros. Como consequência, o câmbio pararia de cair. Adicionalmente, se a atividade econômica fosse colocada nos trilhos, a demanda cresceria mais próxima daquilo que a capacidade instalada das empresas consegue atender.
O resultado seriam importações crescendo a um ritmo mais moderado. Parece tudo muito simples e de muito bom senso. Então, por que apostar nos efeitos tão limitados da alta do IOF?
Em primeiro lugar, porque é uma forma menos antipática de reforçar a arrecadação.
Mas a grande razão parece ser a atual euforia do pleno emprego. E a política fiscal restritiva, um mal necessário, talvez seja adiada para o próximo governo. Infelizmente, quanto maior a demora, maior a dose do remédio amargo a se tomar.


ROBSON GONÇALVES é professor dos MBAs da FGV e consultor da FGV Projetos.


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