São Paulo, segunda-feira, 07 de fevereiro de 2011

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Empresas adotam receituário contra o "risco Chávez"

Para seguir lucrando com país em recessão e ameaças do presidente, companhias se adaptam às regras locais

No "businesschavismo" companhias têm de incluir prazo folgado para não fracassar por atrasos do governo

FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS

O melhor país do mundo para fazer negócios é a Venezuela -sem Hugo Chávez. Com o esquerdista no poder, o país caribenho fica só em segundo lugar no ranking.
A anedota corrente ilustra o paradoxo das empresas, especialmente estrangeiras, que seguem lucrando no socialismo bolivariano, apesar do segundo ano de recessão, do controle cambial e das ameaças de nacionalização.
"Quem disse que a gente precisa de Coca-Cola?", disse Chávez na sexta, no rádio e na TV, para apoiar a greve na engarrafadora mexicana do refrigerante que dura 15 dias.
Se, na foto ampla, o cenário é aterrador, de perto ganha nuances e emerge uma espécie de "manual de sobrevivência" no mercado local.
"É um país "sui generis". Quem faz um contrato e começa a produzir sem verificar se o empresário tem licença de importação e tem licença para os dólares corre o risco de ficar com a mercadoria encalhada", diz José Francisco Marcondes, da Câmara Venezuelana-Brasileira de Comércio e Indústrias.

DEPENDÊNCIA
"É só pensar no Brasil dos anos 1980. Onde há controle de câmbio, há dependência da burocracia e de critérios políticos", continua.
Como cada vez mais quem concentra o poder de compra e contratos é o Estado, é central ter um agente de interface com o governo. Quanto mais alto o escalão, melhor no "businesschavismo".
A Odebrecht, há 18 anos no país, é a maior construtora em operação na Venezuela. Em 2010, sua receita, segundo dados preliminares, foi de US$ 950 milhões. É conhecida a boa relação entre Chávez e Emílio Odebrecht.
O diretor administrativo e financeiro da Odebrecht na Venezuela, Jose Claudio Daltro, frisa que o ponto central é ter "maturidade empresarial internacional" e atuar ajustado a códigos locais.
No caso, o código local pode incluir ter uma operação financeira folgada o suficiente para não se complicar com atrasos do governo e a partir daí calcular prazo e preço.
Ao lado das companhias do Brasil, estão empresas espanholas que seguem pagando o "risco Chávez" -mais alto porque, ao contrário das brasileiras, não estão tacitamente "blindadas" contra expropriações.
As empresas elétricas, entre elas a Elecnor, e a gigante de telecomunicações Telefónica estão na lista das que mais faturaram nos últimos dois anos no socialismo bolivariano enquanto o capitalismo ruía na matriz.
A economia em recessão atravessou uma profunda crise energética que exigiu contratos de emergência -pagos parte na moeda local e parte diretamente em dólares e fora do país, escapando do controle cambial, em um esquema que também é usado pelas construtoras.
No caso do Provincial, filial do BBVA, também se explica a insistência de seu diretor, Pedro Rodríguez, de que o banco não estava à venda. A unidade venezuelana foi a maior responsável pelos lucros do banco na América do Sul em 2009. Em 2010, caiu para quarto.
O caso do Provincial também é o exemplo-chave de que a operação na Venezuela pode exigir dos executivos habilidades peculiares, como desenvoltura na TV.
Na espécie de reality show de Chávez, um empresário pode ser ameaçado ao vivo, mas também pode ser convidado a explicar ao microfone detalhes de um projeto.
Os empresários convidados ao programa semanal de Chávez "Alô Presidente" não raro ficam tensos. Chá pergunta de tudo: do negócio a uma opinião geopolítica.


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