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Corte na Irlanda assusta mercado e eleitor
Sob impacto da redução de € 6 bilhões no orçamento, juros de títulos públicos sobem pelo décimo dia seguido
População aguarda com pessimismo orçamento de 2011, que deve trazer redução das despesas sociais e mais impostos
Mariana Schreiber/Folhapress
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O desempregado Craig Wightman, 36, que vive hoje dos trocados que recebe escrevendo, com giz colorido, pedidos de ajuda nas calçadas de Dublin
MARIANA SCHREIBER
ENVIADA ESPECIAL A DUBLIN
Na quarta da semana passada, o taxista Julie Doyle já
vai logo avisando a quem acaba de desembarcar no aeroporto de Dublin: "Más notícias, o centro está parado por causa da manifestação de estudantes".
O motivo? "O governo quer dobrar a taxa de inscrição no ensino universitário para 3.000."
O protesto reuniu 25 mil
pessoas. Por ora, tais manifestações não são comuns.
"Ainda não. Mas, depois de 6 de dezembro, talvez."
A data é quando o governo
anunciará o Orçamento para
2011, detalhando quais áreas
serão afetadas por cortes de
gastos e aumento de impostos. Nas ruas de Dublin, só se
fala nisso. A expectativa é de menos despesas sociais.
O montante total da tesourada foi anunciado na última
semana: € 6 bilhões (R$ 14,2 bilhões) serão contingenciados do Orçamento.
É apenas a primeira parte
de um total de € 15 bilhões
(R$ 35,5 bilhões) que devem ser economizados até 2014.
"Será um desastre", sentencia Doyle, que dois anos
atrás trabalhava como chofer. "Após a crise, o mercado
acabou. Como taxista, estou apenas sobrevivendo."
O objetivo da contenção de
gastos é tentar reduzir o deficit público para cerca de 3%
do PIB em 2014 e reconquistar a confiança do mercado,
que tem cobrando taxas altas para financiar o governo.
A projeção do ESRI (Instituto de Pesquisa Econômica
e Social da Irlanda) é que o
deficit atingirá 31% do PIB
em 2010, devido ao custo de
resgate ao setor financeiro do
país, que já somou € 42,1 bilhões (R$ 97,45 bilhões), ou
26,3% do PIB do país.
DESCONFIANÇA
O esforço do governo para
tranquilizar o mercado, no
entanto, não surtiu efeito, e
os juros dos títulos irlandeses
com vencimento em dez anos
subiram na tarde de ontem
pelo décimo dia, atingindo
7,87%, um recorde de 5,48
pontos percentuais acima da taxa paga pela Alemanha.
Com a alta das taxas, o governo só pretende voltar ao mercado em 2011.
Mas a manutenção dos juros em níveis elevados tem
aumentado a expectativa de
que a Irlanda será o primeiro
país a acessar o fundo de €
750 bilhões (R$ 1,7 trilhão)
criado por União Europeia e
FMI em maio para financiar governos europeus.
O economista John FitzGerald, do ESRI, discorda. Ele
lembra que o governo tem
em caixa € 25 bilhões e mais € 15 bilhões investidos em
ações, o que deve ser suficiente até o próximo ano.
Um dos motivos da desconfiança que alimenta a alta dos juros é a instabilidade
política. A grande insatisfação popular deve levar à antecipação das eleições parlamentares, de 2012 para meados do ano que vem.
A atual coalizão que sustenta o primeiro-ministro, Brian Cowen, deve perder a maioria no Congresso.
"Se fôssemos franceses, tiraríamos eles à força do governo", diz o desempregado
Craig Wightman, 36, que vive
dos trocados que recebe enquanto escreve, com giz colorido, pedidos de ajuda nas
ruas de Dublin. Ele diz que ficou sem dinheiro para pagar
o aluguel após a quebra da
sua empresa (de entrega de documentos), há três anos.
Apesar de todos os problemas, um relatório da ONU divulgado na última semana
mostra que a Irlanda ainda é
o quinto melhor lugar para
morar no mundo. A expectativa de vida é de 80,3 anos, a
renda per capita é de US$ 33.078 e a escolaridade média soma 11,6 anos.
A jornalista MARIANA SCHREIBER
viajou a convite do governo da Irlanda
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