São Paulo, quinta-feira, 14 de outubro de 2010

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JULIO VASCONCELLOS

ValeDoSilício.com.br


Para que a "profecia" brasileira se realize, falta superar a burocracia, investir e dar exemplos


O MARCO DA ONDA de interesse de investidores no Brasil foi a capa da revista "The Economist" em novembro do ano passado, proclamando que o Brasil está "decolando".
O Brasil, então, se tornou o queridinho dos investidores estrangeiros. Quem não estava de olho no Brasil passou a prestar atenção.
O uso da palavra "bolha" é quase uma hipérbole para a situação atual, mas acredito que não seja um rótulo totalmente injusto.
Tenho visto muitos investidores estrangeiros de olho em "start-ups" brasileiras e alguns que acreditam no potencial do Brasil de se tornar o novo Vale do Silício internacional.
A oportunidade vista no Brasil é bem simples e bastante real, e pode ser resumida da seguinte forma: mais pessoas estão acessando a internet, e cada vez por mais tempo. Acessam de forma mais rápida, sofisticada e rentável. E, mais importante, o crescimento está acontecendo em uma velocidade monumental, com o crescimento da classe média e da economia.
Mas, antes de a "profecia" do nascimento de um Vale do Silício brasileiro se tornar realidade, precisamos superar três grandes barreiras, que muitas vezes impedem o empreendedor de atuar no Brasil.
Em primeiro lugar, as barreiras burocráticas e legais. Entrei na jornada empreendedora preparado para escalar uma montanha de obstáculos legais, mas dei de cara com o monte Everest. Desde o processo de abrir uma empresa, que pode durar meses (comparado com algumas horas no Vale do Silício original) ao labirinto da tributação para tocar uma empresa da forma correta, até o poço sem fim que é o conhecimento dos detalhes cruciais da legislação trabalhista.
É um verdadeiro sufoco para o empreendedor. Querer que isso mude seria otimismo (ou ingenuidade?) demais -então, pelo menos, gostaria de ver um manual simples, objetivo e prático para o empreendedor. Quem sabe criado por outros que sobreviveram a essa jornada.
A falta de capital-semente é outra barreira na criação desse Vale do Silício. Capital de risco ("venture capital") existe. O que falta é aquele primeiro cheque que ajuda o empreendedor a contratar o primeiro funcionário, o empurrão inicial.
A maioria dos investidores de capital de risco quer colocar dinheiro em um projeto que já está engatado -com uma receita inicial e os primeiros clientes-, mas é necessário aquele aporte inicial, muitas vezes feito por um investidor "anjo".
Essa característica do ecossistema financeiro está em falta por aqui, e isso faz com que muitas boas ideias e boas equipes comecem com grandes dificuldades para dar seus primeiros passos.
Não acredito que a solução governamental seja adequada, mas sim que ocorra uma mudança comportamental do próprio ecossistema financeiro. A alocação de capital-semente dentro de grandes fundos de investimento pode ser uma boa forma de alimentar o "pipeline" para investimentos futuros.
O terceiro obstáculo dificulta a vida do empreendedor hoje, mas é um que vamos superar com o tempo: Faltam exemplos de grandes sucessos. No "Vale", ao entrar em um café, a possibilidade de você encontrar alguém que esteve por trás de uma empresa que mudou o mundo é de 90%. Essa disponibilidade de pessoas que já completaram "a jornada" cria uma abundância de guias para novos empreendedores.
Esses guias atuam como investidores-anjos e como mentores para a nova frota. Além da transferência direta de conhecimento e sabedoria, esses guias também servem como modelos. Seu sucesso se torna a prova de que, sim, é possível transformar seus sonhos em realidade!
Não podemos fazer nada para esses guias aparecerem (já temos alguns, mas ainda são poucos). Somente podemos ter paciência que eles virão e esperança de que, quando chegarem, sejam altruístas para benefício das novas gerações. Apesar desses obstáculos para o empreendedor brasileiro, tenho confiança na nossa habilidade de superar o que vem pela frente.
Afinal, estou apostando pessoalmente nessa oportunidade que estamos vivenciando. Embora não seja uma jornada fácil, é bastante divertida e cheia de aprendizado, e que vale a pena por cada dia em que construímos uma nova realidade empreendedora.


JULIO VASCONCELLOS, 29, economista, é fundador e presidente-executivo do site de compras coletivas Peixe Urbano e gerente para o Brasil do Facebook. Escreve às quintas-feiras, mensalmente, nesta coluna.

julio.folha@yahoo.com

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