São Paulo, quinta-feira, 17 de junho de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Serra, Dilma e a crise de Obama


Tucano critica inoperância das agências reguladoras sob Lula, mas entidades fracassam no mundo rico


UMA DAS escassas e principais críticas de José Serra (PSDB) a Lula é dirigida ao estado das agências reguladoras. Segundo o principal candidato de oposição, no período luliano as agências foram ou inoperantes e/ou aparelhadas.
O governo luliano-petista tem na verdade aversão à própria ideia de agências reguladoras. Isto é, de instituições de Estado, não governamentais, encarregadas de zelar pelas políticas públicas de longo prazo; de supervisionar empresas e as relações dessas firmas, em geral concessionárias de serviços públicos, com consumidores e governo.
Será interessante observar como Serra vai desenvolver tal crítica durante a campanha. Trata-se de questão importante e de uma rara diferença crucial entre PT e PSDB. Uma definição mais substanciada de Serra a respeito das agências pode ainda marcar sua diferença em relação ao governo FHC.
Mas mais relevante que antecipar a vera natureza de Serra é o contexto em que o tucano relança o projeto das agências reguladoras. Contexto mundial, em particular. Desde o início do século, há colapsos e fracassos em série de agências e empresas responsáveis pela supervisão do setor privado, pela aferição de credibilidade e transparência de empresas e finança, de classificação de risco e de regulação do mercado.
O desastre começou na verdade com as crises financeiras asiática e russa, em 1997-98. As agências privadas, empresas, de classificação de risco de crédito falharam ridiculamente em ao menos sentir os riscos da crise. Os erros dessas agências não apenas se tornaram mais catastróficos na crise recente: essas firmas foram cúmplices da construção do castelo financeiro que desabou de vez em setembro de 2008.
Na crise de 2001-02, das empresas pontocom, as auditorias, como a falecida Arthur Andersen, foram cúmplices da fraude que ajudou a inflar a bolha. O setor privado não parece capaz de se "autorregular".
As agências, por sua vez, mantêm relações tão deletérias com o mercado quanto os "políticos". No início do século, os reguladores da energia nos EUA foram à lona. Apesar de tantas agências "não aparelhadas" por políticos no mundo rico, como as de supervisão da concorrência, mais e mais se criam oligopólios globais.
As agências que regulam a finança fracassaram espetacularmente, no âmbito intelectual, moral, prático e político na supervisão das monstruosa finança e de seus mecanismos de "autorregulação", as tais auditorias e empresas classificadores de risco de calote inclusive.
Nesta semana, Barack Obama, presidente dos EUA, foi obrigado a fazer um pronunciamento nacional a fim de tentar limpar um pouco da lama petrolífera que desmoraliza seu governo. Isto é, para falar duro a respeito do maior desastre ambiental dos EUA, causado pela BP.
Obama tem dito que a relação entre petroleiras e agência reguladora é muita vez corrupta. Sob lobby das petroleiras, as agências vinham permitindo cada vez mais "autorregulação" no setor. Pode ser que governos sejam ineptos e corruptos na sua relação com o mercado, mas agências e "autorregulação" têm se mostrado um fracasso de dimensão semelhante.
Em que ponto entre supervisão privada, paraestatal e governamental Serra vai se situar? E Dilma?

vinit@uol.com.br


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