São Paulo, quarta-feira, 18 de agosto de 2010

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VINICIUS TORRES FREIRE

Deixa o mundo me levar


Concorrente da Vale tenta comprar maior fábrica de fertilizante do planeta; agronegócio mundial ferve

UMA DAS três maiores mineradoras do mundo, a BHP tentou ontem comprar a maior produtora de fertilizantes do mundo, a canadense Potash, por US$ 39 bilhões (R$ 68 bilhões). A Potash rejeitou com raiva a oferta, que seria uma das maiores aquisições da história. E daí?
Para começar, a BHP é concorrente da Rio Tinto e da brasileira Vale, que, aliás, neste ano, gastou cerca de US$ 6 bilhões para comprar fábricas de fertilizante de múltis no Brasil. Em maior ou menor escala, as três são produtoras de matérias-primas de fertilizantes. As mineradoras devem consolidar o negócio de fertilizantes e seus insumos. Mais oligopólio num mercado mundial já concentrado como o de fertilizantes.
Segundo, o interesse da BHP pela Potash é mais um sinal da relevância crescente do comércio mundial de agropecuários. Apesar da importância dada (e merecida) a fatores como câmbio ou "custo Brasil" na explicação do comércio exterior, este nosso país ainda pequeno (ou "dependente") é arrastado por tendências mundiais difíceis de evitar (mas que podem ser atenuadas). Em 2003, 29% das exportações eram de produtos básicos; em 2010, 43% (dados dos primeiros semestres). O preço dos nossos produtos básicos de exportação cresce muito mais que o dos manufaturados.
Terceiro, o sucesso da agropecuária e da mineração, além do brutal aumento da demanda planetária por esses nossos produtos, é que nos deu uma folga para crescer razoavelmente nos anos Lula.
Quarto, o Brasil é um grande importador de fertilizantes. Quem já cuidou de pelo menos um jardim, horta ou vaso de plantas deve ter comprado um pacotinho de adubo com as letras N-P-K: nitrogênio, fósforo, potássio. Trata-se também, óbvio, das matérias-primas dos fertilizantes da agricultura. Dentre os países com grande agricultura, o Brasil é o mais ou dos mais dependentes de fertilizantes importados: cerca de 75% de nitrogenados, 50% de fósforo e 90% de potássio -dependência crescente. É dos grandes itens da pauta de importações do país. Por vezes, representa metade do custo de produção do agricultor.
Parte importante do agronegócio brasileiro está com as múltis. Por exemplo, não produzimos fertilizantes; as múltis compram parte das usinas de álcool, as maiores empresas de comercialização de commodities são múltis. Problema?
Forçar a barra para "nacionalizar" ou criar "campeãs nacionais" em geral tem sido contraproducente (criar subsídios, reservas de mercado, proteções tarifárias loucas etc.). O governo pensou até em criar uma estatal de fertilizantes, embora exista pouca clareza a respeito do retorno do investimento no setor. Além do mais, há múltis porque o capital é escasso no país. Mas por que somos incapazes até de explorar a fundo as vantagens produtivas do país?
O resumo dessa opereta curta não deve ser uma bravata nacionalista e protecionista. Mas uma olhada rápida para qualquer setor da economia mostra que pouco temos controle sobre caminhos ou descaminhos do nosso crescimento. Os motivos são vários: deficiências de política econômica, burocracia estatal, infraestrutura ruim, políticas setoriais pobres ou empresariado conservador etc. Queixar-se apenas da "desindustrialização devida ao câmbio" ou da "ineficiência devida ao custo Brasil" é miopia ideológica.

vinit@uol.com.br


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